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Por que reduzir velocidade?


Por Mariana Czerwonka Publicado 04/08/2015 às 03h00 Atualizado 08/11/2022 às 22h47
 Tempo de leitura estimado: 00:00

Dr. Dirceu Rodrigues Alves Júnior*

Velocidade nas viasNão temos dúvida de que essa é uma medida protetora que reduzirá as gravíssimas lesões que chegam a todo momento em nossos hospitais. Uns evoluindo para morte, outros para a incapacidade definitiva. Quantos mais serão devorados pelos predadores do trânsito?

Quando se estuda causas de acidentes e mortes no trânsito, de início, esbarra-se no fator principal, a velocidade. Quando aumentamos a velocidade aumentamos a energia do movimento (energia cinética). Quanto maior essa energia maior a possibilidade de lesões cada vez mais graves.

Imagina: você no seu automóvel, desenvolvendo uma determinada velocidade e sem saber como explicar, você está estendido no asfalto à espera de um socorro.

Sempre achamos que isto acontece com os outros, não com a gente. A ABRAMET (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego) comprometida com a manutenção da vida, inconformada com as graves lesões que chegam aos nossos hospitais, com sofrimento de famílias, altos custos de tratamento, incapacidades temporárias e definitivas, comprometendo jovens numa faixa etária altamente produtiva e muitos chegando à perda da vida, não pode aceitar tudo que estamos a assistir no trânsito brasileiro.

O entendimento e aceitação tem que excluir a ideia de que o objetivo é aumentar a arrecadação, produzir maior lentidão ou engarrafamento. Temos que correr sim, mas atrás da manutenção da vida, da redução das mortes e sequelados produzidos por esse trânsito.

O engarrafamento e lentidão do trânsito é problema que vem de longa data, é crônico, que precisamos resolver. Não surgiu com redução da velocidade, aliás, essa redução possibilita a maior fluidez. A alta velocidade faz com que se acumulem veículos, enquanto mantendo-a baixa e uniforme as conhecidas lentidões e engarrafamentos tendem a redução. O maior responsável por isso é o excesso de veículos nas ruas.

Temos que deixar de pensar na individualidade e sim no coletivo. Só nos revoltamos, reagimos, pedimos justiça quando alguém da nossa família foi atingido. Mas toda a sociedade reagirá só quando perder um ente querido? A desorganização de ideias, muitas maliciosas, ainda não se conscientizou que necessitamos de atitudes firmes, objetivas para redução das mortes e sequelados em nossas vias.

O mundo está mudando, a Organização das Nações Unidas (ONU) diante do absurdo de 1,2 milhões de mortes e 50 milhões de lesionados no trânsito no mundo, propôs a redução de 50% nessa década de 2011 a 2020. Pior é que com uma frota bastante reduzida em relação a outros países, nos encontramos no terceiro lugar no ranking mundial.

Voltamos a afirmar que a velocidade é o primeiro fator desencadeante de mortes no trânsito. Os veículos produzidos no Brasil são frágeis segundo a Latin Ncap, não são capazes de absorver a energia de uma colisão, permitindo que essa energia se propague para dentro do veículo causando danos muitas vezes irreversíveis a quem esta no seu interior.

Estudos que se iniciaram em Londres, propagando-se para o resto da Europa mostram que a 32 Km/h podemos causar mortes em 5% de pedestres, 65% serão lesionados e 30% ficarão ilesos.

Aumentando para 48 km/h teremos 45% de óbitos, 50% de lesionados e 5% de ilesos. Pisando mais no acelerador e com 64 Km/h teremos 85% de óbitos e 15% de lesionados.

Veja que com baixa velocidade o que podemos causar, não esquecendo que entre as máquinas que transitam circulam pessoas que também não são preparadas, não conhecem os riscos que essa máquina sobre rodas oferece.

Esses estudos de engenharia e medicina de tráfego iniciado em Londres, como dissemos, levou vários países de primeiro mundo a adotarem a regra, reduziram as velocidades. Hoje as transgressões no trânsito em nossas cidades são absurdas, o desrespeito às regras de trânsito está se perpetuando. Parece que normal é transgredir. Precisamos conter os absurdos para podermos ter uma mobilidade mais segura, terminando com os sinistros e o sofrimento de todos.

A violência no trânsito é caracterizada pelos xingamentos gestuais e verbais, fechadas, farol alto na cara, agressões físicas e até morte. A fúria está presente. Os veículos blindam o motorista e lhe tiram a cidadania, o respeito, levando-o a distúrbios comportamentais que vão repercutir no organismo gerando insatisfação e autoagressão.

Não vemos a redução como forma de arrecadação, essa é uma fuga para aqueles que conseguem seguir regras próprias sem um real benefício de si e da sociedade como um todo. A implantação a que muitos estão reagindo, não aceitando, buscando alternativas para justificar o absurdo que acham na nova regra adotada, não se justifica.

A responsabilidade é de técnicos em engenharia de tráfego que buscam o bem estar físico, mental e social da população. Estudos de longa data certamente foram feitos. Em São Paulo, mais precisamente na avenida 23 de maio foi um dos experimentos, onde houve boa aceitação, maior fluidez do trânsito, queda dos acidentes e redução das lesões provocadas.

Há necessidade de colaboração das organizações governamentais, não governamentais e da sociedade no sentido de entenderem o objetivo maior a ser atingido, preservar vidas.

Ver e dizer “Está lá mais um corpo estendido no chão”, traduz a vergonha de não protegermos nossas vidas.

Temos hoje, números de óbitos e incapacitados temporários e definitivos para a vida a crescer todos os dias. Em 2014 morreram no país, no trânsito, 54 mil pessoas, 330 mil ficaram incapacitados definitivamente. A faixa etária é entre 18 e 34 anos. Estamos a perder mão de obra, a produção caindo, a arrecadação baixando a cada ano em função dessa perda.

Anos estão a passar e nenhuma atitude séria, objetiva é apresentada. Alguém falou que nas marginais não há pedestres. Há sim, nas calçadas das pistas locais, entre os veículos surgem os ambulantes que não são combatidos pela policia de trânsito, não são retirados e tão pouco têm sua mercadoria apreendida.

O mundo moderno exige pressa e com isso, todos que estão em movimento cometem transgressões absurdas comprometendo os que estão nas vias. A falta da autoproteção é o erro coletivo.

Conclusão: a toda mudança reações contrárias sempre existirão. As prefeituras estudam soluções para as situações de risco com objetivo de proteger a sociedade.

Quando cai um avião a mídia sensibiliza a população mundial. Morrem 154 pessoas por dia no trânsito em nosso país, nada sensibiliza a mídia e a sociedade. A morte na queda de uma aeronave com 189 ocupantes a bordo gera um memorial, enquanto no trânsito o máximo é uma cruz colocada pela família à beira da via e o sentimento é unicamente daquela família. Precisamos repensar o comportamento adotado. Só sofremos quando temos um parente envolvido nesses acidentes.

Quando temos um cadeirante ou um inerte na cama é que queremos tomar atitudes, mas é tarde. Será que vamos precisar que isso aconteça com todas as famílias brasileiras, para mudanças radicais tomarmos? Precisamos nos unir, entendermos que a máquina sobre rodas é um perigo iminente e não um brinquedo de gente grande.

* Dr. Dirceu Rodrigues Alves Júnior é Diretor de Comunicação e do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da ABRAMET – Associação Brasileira de Medicina de Tráfego

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