
A Comissão de Viação e Transportes (CVT) da Câmara dos Deputados deve realizar uma audiência pública para discutir a proposta do governo que pretende acabar com a obrigatoriedade de frequentar autoescola para obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). A medida, anunciada pelo Ministério dos Transportes, promete reduzir custos e flexibilizar a formação de condutores, mas entidades do setor contestam as estimativas e alertam para riscos à segurança viária.
O requerimento para a audiência foi apresentado pelo deputado Leônidas Cristino (PDT-CE) em 4 de agosto. O objetivo é avaliar os impactos da mudança, que permitiria aos candidatos escolher entre cursos em autoescolas, instrutores autônomos credenciados ou ensino teórico a distância, mantendo apenas os exames obrigatórios.
A proposta do governo
Atualmente, para tirar a CNH, é necessário cumprir 45 horas-aula teóricas e 20 horas de prática em um Centro de Formação de Condutores (CFC). A proposta do governo prevê que o candidato possa optar por formas alternativas de aprendizado, incluindo instrutores particulares ou cursos digitais oferecidos pela Senatran.
Conforme o Ministério dos Transportes, a medida poderia reduzir em até 80% o valor da CNH nas categorias A (motos) e B (carros de passeio) e flexibilizar a preparação para as categorias C, D e E. A intenção seria democratizar o acesso à carteira, barateando custos e reduzindo a informalidade.
Entidades contestam a redução de custos
Porém, entidades do setor, como a ABRAUTO, desmentem essas promessas. De acordo com a Associação, taxas cobradas pelos Detrans e exames já correspondem a cerca de metade do valor total da CNH, e o uso de instrutores particulares ou veículos próprios poderia aumentar os custos, e não reduzi-los.
Além do aspecto financeiro, as entidades alertam para riscos à segurança viária. O ensino prático em veículos sem duplo comando e sem identificação visual poderia elevar o número de acidentes. Ou seja, especialmente em situações críticas em que o aprendiz reage de forma inadequada.
Papel das autoescolas na segurança viária
O deputado Leônidas Cristino destaca no requerimento que o treinamento conduzido por profissionais qualificados, como ocorre nas autoescolas, é hoje uma garantia mínima de que o candidato à CNH receba orientação adequada antes de enfrentar o trânsito.
Embora as aulas, por si só, não assegurem que o motorista esteja pronto para dirigir, o contato com instrutores capacitados e veículos adaptados oferece um ambiente de aprendizagem mais seguro. Os carros de autoescola, equipados com duplo comando de freio, permitem que o instrutor intervenha em situações de risco, prevenindo acidentes durante a formação.
Cristino também ressalta que, sem esse acompanhamento, candidatos poderiam recorrer a treinos informais — como aprender a dirigir com parentes — o que, além de ilegal, coloca em risco tanto o aprendiz quanto terceiros.
Outros pontos de atenção
O requerimento também lembra que países citados como exemplo — Japão e Reino Unido — registram índices de mortes no trânsito muito inferiores aos do Brasil, em parte devido à eficiência da fiscalização e à cultura de segurança viária.
Outra crítica é dirigida a declarações do ministro Renan Filho de que “irmão mais velho” poderia ensinar o mais novo a dirigir, apontando que a prática representa incentivo à condução ilegal e à exposição do aprendiz a veículos não preparados para aulas práticas.
Quem deve participar da audiência
O requerimento sugere a participação de representantes de órgãos públicos, especialistas e entidades ligadas ao trânsito, entre eles:
- Adrualdo de Lima Catão, Secretário Nacional de Trânsito (Senatran);
- Givaldo Vieira, presidente da Associação Nacional dos Detrans (AND);
- Ygor Valença, presidente da Federação Nacional das Autoescolas (FENEAUTO);
- Rodolfo Rizzotto, SOS Estradas;
- Representante do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV);
- Nicole Goulart, diretora nacional do SEST-SENAT;
- Marcus Quintella, diretor da FGV Transportes;
- Representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT).
Próximos passos
A audiência só será realizada após aprovação do requerimento pela CVT. O debate pretende confrontar diferentes visões sobre acesso, segurança e qualidade da formação de motoristas. Assim, avaliando alternativas para tornar a CNH mais acessível sem comprometer a segurança nas ruas e estradas.