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23 de outubro de 2024

Artigo – Memória olímpica


Por Artigo Publicado 26/07/2021 às 18h26 Atualizado 08/11/2022 às 21h25
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Aproveitando a realização das Olimpíadas no Japão, J. Pedro Corrêa aborda o espírito dos jogos e recorda o o evento de 1972 que ficou marcado na história.

*J. Pedro Corrêa

OlimpíadasFoto: Pixabay.com

Como os olhos do Brasil e do mundo estarão voltados até o começo de agosto para o Japão por causa dos Jogos Olímpicos achei que poderia fugir hoje da temática do trânsito para contar um capítulo da minha vida profissional voltado às Olimpíadas. Quem acompanha meus artigos, tão comprometidos com a segurança no trânsito, pode se surpreender. No início de minha carreira fui jornalista esportivo trabalhando em rádios, jornais e tvs nos anos 60 e 70 do século passado. Participei de grandes eventos esportivos e sempre nutri sonhos de cobrir um grande acontecimento de porte mundial.

Em 1972 tive minha grande chance quando trabalhei como jornalista na cobertura das Olimpíadas de Munique, Alemanha, justamente aquelas que ficariam marcadas na história pelo atentado terrorista que culminou com a morte de vários atletas israelenses e dos próprios extremistas árabes. Embora o episódio tenha sido tão marcante, que dificilmente se apagará da minha lembrança, quero refrescar minha memória esportiva relembrando a experiência de ter vivido algumas semanas num ambiente tão marcante como dos jogos olímpicos.

Para começar, é preciso salientar as enormes diferenças entre aquela época e o momento que vivemos hoje, sem contar as consequências da pandemia do Covid-19.

Os mundos da política mundial, da economia, da tecnologia e do próprio esporte eram muito diferentes dos que hoje acompanhamos pelos meios de comunicação.

De lá para cá, os avanços no desenvolvimento dos esportes “amadores” registraram saltos extraordinários. Os índices dos atletas campeões de hoje eram inimagináveis naquela época e a medicina esportiva de então, engatinhava, comparando-se com a atual. A cobertura da imprensa era muito mais modesta, com relativamente poucos jornalistas presentes, poucas transmissões de rádio, a televisão iria transmitir pela primeira vez um evento daquela magnitude e por isso não saiu como previsto. Era a primeira vez que uma tv brasileira cobriria os jogos olímpicos e os problemas foram debitados ao aprendizado.

Em 1972, o Brasil não era um forte candidato a medalhas pois o apoio aos esportes amadores aqui era substancialmente menor. E, assim, não foi surpresa ter encerrado os jogos com apenas duas medalhas de bronze, em competições individuais. Embora as vitórias brasileiras fossem importantes, para mim o que contava mesmo era viver o espírito olímpico, o da confraternização entre atletas de nações de desníveis abismais.

Trabalhando como free lancer para as rádios Deutsche Welle, da Alemanha e a Emissora Nacional da Suíça, de quem era funcionário, me interessei particularmente em sentir as emoções de quem estava nos jogos para defender seus países, para aproveitar uma oportunidade de aparecer e muitos que, sabendo que não tinham chances de resultados, vinham pelo puro espírito de competir por competir.

Velhos tempos, aqueles.

Na própria delegação brasileira, conversando com vários atletas durante os jogos, deu para sentir seus desejos de orgulho de representar o país. Admitindo, porém, a falta de suporte por parte das entidades esportivas nacionais e do próprio Governo. Contudo, era recorrente ouvir que “um dia seríamos grandes e subiríamos ao topo do pódio”, o que efetivamente começou a acontecer mais tarde.

Se este sentimento era forte entre os brasileiros com quem conversei, posso dizer que ouvi relatos ainda mais fortes de atletas de outros países. Sobretudo dos então chamados “países do Leste europeu”, ditos comunistas, cuja demonstração de amor à pátria era de emocionar. Para alguns deles – cheguei a ouvir – os resultados nos jogos poderiam determinar a qualidade de vida de suas famílias no futuro.

Assim, quando assisto hoje pela tv os esforços de atletas de países bem mais modestos como africanos ou asiáticos, não vejo como não lembrar dos grandes heróis anônimos que conheci nos jogos de 1972. Estes não participaram sonhando com medalhas, mas pelo espírito olímpico de simplesmente competir.

A pergunta que resiste é se este espírito, apesar das aparências, ainda existe hoje em dia e sou tentado a responder que sim.

Creio que a despeito do momento absurdamente competitivo que vivemos atualmente, ainda há espaço para sonhos mais modestos. E que nem por isso devem deixar de serem sonhados.

Dos mais de 11 mil atletas participantes das Olimpíadas deste ano quantos sonhavam com um ouro ou um bronze olímpico? Certamente pouquíssimos, pertencentes a uma elite esportiva, apoiada por fortíssimos esquemas financeiros que por sua vez contam com altos retornos comerciais. Esta marca que se afirma cada vez mais no esporte mundial, apesar de toda sua força, felizmente ainda não foi capaz de destruir o espírito olímpico de tantos atletas ao redor do mundo que ainda acreditam num mundo melhor.

Como ex-jornalista esportivo que uma vez também acreditou que o esporte seria capaz de unir o mundo e fazer a paz prevalecer, ainda torço por estes atletas a quem quero homenagear por serem símbolos da esperança de melhores dias para a humanidade.

*J. Pedro Corrêa é Consultor em Programas de Segurança no Trânsito

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