CNH: Quando o alto custo da ignorância supera o investimento em educação
Artigo de Vilnei Pinheiro Sessim aponta que condutores sem habilitação é um problema complexo, que envolve não apenas dinheiro, mas desigualdade social, acesso à educação e falta de políticas públicas consistentes de mobilidade.

*Vilnei Pinheiro Sessim
A declaração do Ministério dos Transportes, de que 20 milhões de brasileiros não possuem a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) por conta do alto custo, soa simples e popular. Mas é uma visão reducionista de um problema complexo, que envolve não apenas dinheiro, mas desigualdade social, acesso à educação e falta de políticas públicas consistentes de mobilidade.
Dados do IBGE mostram que, no Nordeste, apenas metade da população em idade ativa está ocupada, com rendimento médio de R$ 2.404. No Norte, a informalidade predomina. Já no Sul e Centro-Oeste, os salários superam R$ 3.800 e o desemprego é bem menor.
Nessas condições, a dificuldade de se habilitar não está apenas no preço, mas na falta de renda estável e na ausência de oportunidades formais de trabalho que deem sentido à habilitação.
Outro fator relevante é a educação.
O Brasil ainda tem 8,5 milhões de analfabetos, e muitos brasileiros não conseguem sequer cumprir o requisito básico de escolaridade para iniciar o processo de habilitação. Portanto, reduzir a discussão ao custo é ignorar que a CNH exige conhecimento, compreensão de regras e responsabilidade — elementos fundamentais para garantir a percepção de risco e segurança no trânsito.
Há ainda diferenças regionais na frota: enquanto o Sudeste concentra 29 milhões de veículos, o Norte tem apenas 1,6 milhão. Nessas regiões, a motocicleta é o principal meio de transporte e sustento, mas muitas vezes usada sem habilitação, em meio à falta de fiscalização e alternativas de transporte público.
Ou seja, o problema não é só pagar pela CNH, mas a ausência de políticas eficazes para inclusão e regularização de todo o Sistema Nacional de Trânsito.
Tratar o tema apenas como uma questão de preço é populista e perigoso. A CNH deve ser vista como um instrumento de educação e preservação de vidas, não como um fardo financeiro. O caminho correto é ampliar programas sociais como a CNH Social, investir em educação básica e valorizar a boa formação de condutores. Retroagir justo no momento de formação dos novos condutores a qualquer custo pode sair mais caro: mais acidentes, mais mortes e mais famílias destruídas. O Brasil necessita evoluir na mudança de cultura no trânsito.
*Vilnei Pinheiro Sessim é presidente do SindiCFC do Rio Grande do Sul e presidente do Instituto Zero Acidente
