Por que os Detrans precisam de tempo para implementar as novas regras da CNH do Brasil
Com a entrada em vigor da Resolução 1.020/25 e da MP “CNH do Brasil”, Detrans estaduais pedem prazos técnicos de até 180 dias para adaptação de sistemas, fluxos, exames e procedimentos antes de aplicar integralmente as mudanças, garantindo segurança jurídica e continuidade dos serviços.

Com a publicação da Resolução nº 1.020/25 do Contran e o surgimento do programa “CNH do Brasil”, que amplia e redefine as regras para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), os Departamentos Estaduais de Trânsito (Detrans) em diversas unidades da federação pedem tempo técnico para implementar as mudanças. Em vez de aplicar de imediato as novas regras, órgãos como os de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina — entre outros — optaram por períodos de até 180 dias para adequar sistemas, procedimentos bem como fluxos operacionais antes da aplicação prática.
A nova resolução do Contran tem o objetivo de modernizar, democratizar e flexibilizar o processo de habilitação no Brasil, incluindo, entre outras medidas, a eliminação da obrigatoriedade de realização de aulas em autoescolas para todos os candidatos e a disponibilização de conteúdo teórico gratuito e digital. No entanto, essa modernização exige uma série de ajustes nos sistemas estaduais e na operação das autarquias, os quais não estavam previstos com prazos de transição na norma federal — motivando o pedido unânime de prazo pelos Detrans.
Principais desafios dos Detrans para aplicar a Resolução 1.020/25
1. Falta de prazo de transição na norma federal
Uma das principais dificuldades apontadas pelos órgãos é que a Resolução 1.020/25 não previu um período de adaptação entre o modelo antigo e o novo, ou seja, isso torna inviável aplicar imediatamente todas as mudanças estruturais. Na ausência de uma vacatio legis ou prazo de transição oficial, os estados decidiram estabelecer internamente cronogramas técnicos que garantam a continuidade e a segurança dos serviços.
2. Adequação de sistemas informatizados e integração com o RENACH
Os Detrans precisam ajustar seus sistemas internos para integrar plenamente a nova Resolução com o Registro Nacional de Condutores Habilitados (RENACH), bem como garantir que plataformas digitais ofereçam funcionalidade estável, segura e integrada ao modelo proposto pela CNH do Brasil. Isso inclui a digitalização de fluxos, adaptação de bancos de dados e repaginação de interfaces de atendimento ao público.
3. Ajustes nos exames teóricos e práticos
Uma das alterações com maior impacto prático é a redução de carga horária obrigatória e a flexibilização de como o candidato pode fazer suas aulas — seja em autoescolas tradicionais ou com instrutores credenciados. Essa transição exige que os órgãos estaduais revisem a pauta de conteúdos considerados essenciais, reorganizem a estrutura de aplicação de provas e treinem examinadores para um novo paradigma de avaliação.
4. Treinamento e capacitação das equipes
Os processos internos de atendimento ao público e execução de etapas (como coleta biométrica, agendamento e fiscalização) sofrerão mudanças. Por isso, os Detrans argumentam que precisam treinar servidores, examinadores e agentes para assegurar que a operação seja consistente com as diretrizes da nova normativa — evitando falhas que poderiam gerar insegurança jurídica ou prejuízos a candidatos.
5. Preservação dos processos em andamento
Outro ponto fundamental é a preservação dos processos de habilitação que já estão em curso. Sem um período de transição claro, existe risco de confrontar normas antigas com as novas, criando conflitos jurídicos ou até a possibilidade de nulidades ou exigências retroativas para pessoas que já iniciaram o processo com base em regras anteriores.
Estados adotam prazo de 180 dias
Atendendo a esses desafios, vários Conselhos Estaduais de Trânsito (CETRANs) deliberaram internamente para conceder um período de 180 dias para que seus Detrans façam as adequações técnicas necessárias — antes da entrada em vigor prática das mudanças.
No caso de São Paulo, a Deliberação CETRAN-SP nº 10, publicada em Diário Oficial em 10 de dezembro de 2025, constitui a primeira norma estadual formalizada que fixa esse prazo para o Detran-SP — órgão que representa o maior fluxo de habilitações no país. As resoluções de Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina seguem a mesma lógica, embora ainda dependam de publicação oficial em seus diários.
Outros estados, como Mato Grosso do Sul e Pará, já divulgaram notas oficiais anunciando que estudam a Resolução 1.020/25, além disso, que a implementação será gradual, reforçando a tendência de uma transição planejada e coordenada por todo o país.
Garantia de segurança jurídica e continuidade do serviço público
A principal razão pela qual os Detrans defendem esses prazos é a necessidade de segurança jurídica. A ausência de transição formal pode gerar incertezas quanto à aplicação prática de regras, penalizações e processamento de dados — o que pode comprometer tanto a eficiência dos serviços quanto os direitos de candidatos e cidadãos.
Ao conquistar um prazo de até 180 dias para se adequar, os Detrans garantem que:
- O modelo digital e operacional será testado e ajustado progressivamente;
- As equipes terão tempo para capacitação adequada;
- Os usuários não serão surpreendidos por mudanças abruptas;
- Processos iniciados sob o modelo anterior serão tratados de forma consistente e legal.
Tempo técnico é condição para que as mudanças funcionem na prática
As novas regras da CNH representam uma das maiores mudanças estruturais já feitas no modelo de habilitação no Brasil. Ou seja, a Resolução 1.020/25 e o programa CNH do Brasil trazem propostas que envolvem digitalização de etapas, flexibilização da formação e reestruturação de procedimentos historicamente consolidados nos Detrans estaduais.
No entanto, a experiência dos próprios órgãos de trânsito demonstra que não é possível implementar nenhuma mudança desse porte de forma imediata, sem testes, ajustes e planejamento. É preciso adaptar sistemas, treinar equipes, redesenhar fluxos e publicar normas internas para garantir que o novo modelo funcione de forma segura e estável.
É por isso que os Detrans defendem que o prazo de até 180 dias não representa resistência à mudança, mas sim uma etapa necessária para assegurar segurança jurídica, continuidade do serviço público e proteção ao cidadão.
A adoção de períodos de transição, como já oficializado por São Paulo bem como sinalizado por outros estados, mostra que o Sistema Nacional de Trânsito caminha para uma implementação gradual e coordenada.
Na prática, o recado dos órgãos estaduais é claro: as mudanças virão, mas é preciso aplicá-las com responsabilidade. Sem tempo técnico para adaptação, o risco não é apenas operacional — é institucional, jurídico e social, com impacto direto na formação de novos condutores e, consequentemente, na segurança viária.
