Guerra no trânsito favorece a fúria
Recentes casos de atropelamentos de ciclistas, como o dos integrantes do Massa Crítica, em Porto Alegre, o do jovem que teria sido morto e abandonado por um deputado no Paraná, e o das ciclistas de São José dos Campos (SP) que foram atingidas por um carro em alta velocidade, chamam a atenção para problemas cada vez mais comuns nas grandes cidades brasileiras: violência, imprudência e descontrole emocional no trânsito. Acessos de raiva quase tão intensos como aquele ficou famoso no filme “Um Dia de Fúria”, estrelado por Michael Douglas, saíram das telas do cinema e foram parar nas ruas das capitais. Falta de transporte público adequado, ruas que não comportam o número de carros, pessoas cada vez mais sobrecarregadas com compromissos e maior necessidade de deslocamento, pressão social por velocidade. Os fatores que levam a quadros críticos de ansiedade, estresse, frustração, agressividade em motoristas, motociclistas, ciclistas e pedestres são muitos e, na maioria das vezes, atuam em conjunto. Segundo os especialistas ouvidos pelo UOL Notícias, o trânsito nas grandes cidades piorou muito nas últimas décadas e tornou-se ainda mais urgente aprender a lidar com ele, dentro e fora do carro. O primeiro passo ressalta o especialista em segurança no trânsito Eduardo Biavatti, autor do livro “Rota de Colisão”, é entender que o espaço é público, ou seja, é de todos. “Quando alguém perde completamente o controle emocional ao volante ou sai em disparada atravessando a pé uma avenida, confrontando os carros e ônibus, esse ato é o ápice de muitas causas. A disputa por cada metro pode desencadear o ódio de condutores e pedestres, mas isso se dá, por outro lado, porque nenhum deles foi capaz de compreender que o espaço não lhes pertence. Acredito que seria um avanço disseminar essa noção básica de cidadania: o carro é seu, mas o espaço é de todos”, diz. Além disso, defende ele, o brasileiro é um “sabotador de regras” e isso tem grande reflexo no trânsito das cidades. “Fazemos isso de modo tão generalizado e tão intencional que o Estado torna-se absolutamente incapaz de punir”. O psicólogo Luís Riogi Miura, que há mais de duas décadas lida com políticas de trânsito, concorda. Segundo ele, quanto mais permissiva é a sociedade e quanto maior o sentimento de impunidade, mais graves serão as reações. “Nós temos uma grande quantidade de infrações, acidentes e crimes porque nossas regras, apesar de serem boas, são falhas e as pessoas abusam, principalmente aqueles que se acham mais fortes. Na guerra entre motoristas, ciclistas e pedestres, o mais fraco e vulnerável é sempre a vítima. E o que muda essa lei do mais forte é a civilidade, e respeito às regras”, explica. Miura, que foi responsável por implantar com sucesso campanhas educativas em Brasília (DF), Maringá (PR) e Boa Vista (RR), como a do respeito à faixa de pedestres e ao uso do cinto de segurança, acredita que educar o motorista para respeitar o mais fraco é uma solução, mas de muito longo prazo. “Quem sabe com mensagens educativas nossos netos já comecem a mudar alguma coisa. Mas acho que a educação não corrige uma falha que vem dos pais. Isso só os agentes públicos com punições personalizadas”, defende. “A educação poderia levar a maioria dos cidadãos a aderir às regras voluntariamente, mas ela pode muito, mas não pode tudo”, completa Biavatti. Leia a reportagem completa no UOL Notícias