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Artigo: Outra chance


Por Artigo Publicado 17/02/2021 às 21h00 Atualizado 08/11/2022 às 21h34
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O artigo de J. Pedro Corrêa aborda o início tímido da 2ª Década Mundial de Ações de Trânsito no Brasil e a necessidade de uma coordenação nacional eficiente para que possa atingir seus objetivos.

*J. Pedro Corrêa

O motivo pode ter sido a pandemia, pode que tenha sido o problema social com o desemprego amedrontador, a situação econômica do país ou, bem provável, a soma de todas estas razões para explicar porque a chegada da 2ª Década Mundial de Ações de Trânsito no Brasil começou quietinha, sem qualquer pompa ou cerimônia.

Era natural que tivesse tido uma recepção ruidosa, com inúmeros registros e votos de sucesso. Afinal, é um fato da importância.

Não vi nada disso. Quero torcer para que não tenha sido por desprezo pelo tema e, pior, que ele fique relegado a um terceiro plano enquanto a violência do trânsito continua. Me lembro que, por ocasião da 1ª Década, via não só menções na imprensa como também em sites assim com reprodução da logomarca em vários portais. Hoje, já na metade de fevereiro, me preocupo porque vejo tudo muito parado.

O problema parece estar no fato de que esta segunda década não tem “paternidade assumida” no Brasil, aliás, como tampouco teve a primeira. A década é uma decisão da ONU, que delega à OMS a sua coordenação pelo mundo afora e, aí, cabe aos governos aderirem e apoiarem o movimento através de ações as mais diversas para baixar o índice de sinistralidade.

Cada governo decide a maneira como vai atuar.

Tanto a ONU como a OMS não dispõem de representação local no país para incentivar uma grande ação nacional. Bancos multilaterais e organizações voluntárias internacionais ligadas ao processo fazem sua parte incentivando programas locais e, eventualmente financiando atividades regionais.

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Artigo: ONGs do trânsito 

Artigo: Sinistro de trânsito 

Até agora, metade de fevereiro, não vi ainda qualquer movimento nacional no Brasil anunciando um plano de ação para a 2ª Década. Sei que algumas ONGs internacionais, financiadas de fora do país, darão apoio à algumas das nossas capitais, mas ainda não conheço detalhes destas ações.
O que me preocupa é não ter visto ainda qualquer instituição pública ou privada para catalisar informações e disseminá-las pelo país, incentivando órgãos de governos, prefeituras, ONGs e outros entes a se envolverem nas ações da 2ª década.

Por ser a principal entidade do Sistema Nacional de Trânsito, o Denatran parece ser este órgão, mas por enquanto não encontrei nada no seu site oficial.

Outra possibilidade de surgir uma liderança nacional do movimento seria se o Observatório Nacional de Segurança Viária assumisse esta função. Bem conhecido por inúmeras ações em todo o país, notadamente pelo Maio Amarelo, o ONVS tem condições de catalisar estas ações, dar a devida divulgação a elas e ser o farol que vai iluminar o caminho de tantas cidades, ONGs, OSCIPs dispostas a fazer sua parte.

OK, você dirá, mas ainda estamos bem no começo da década e temos outros desafios enormes para absorver nossa atenção neste início de ano. É verdade, digo eu, mas se não nos mobilizarmos agora, quando temos a grande motivação de iniciar a corrida com o pé direito, qual será o momento adequado para darmos a partida?

O complicado neste quadro em que “a década é de todos” é que estamos cansados de ver que quando alguma coisa é de todos, acaba não sendo de ninguém, isto é, não acontece nada e o Brasil não pode se dar ao luxo de perder a grande oportunidade de tirar o seu trânsito da contramão.

Um exemplo da confusão que a falta de coordenação pode significar está na ausência de estatísticas para desenvolver este trabalho. Julgo essencial que o Ministério da Saúde faça uma boa divulgação das estatísticas de sinistros de trânsito para que a sociedade possa saber o tamanho do desafio. O último número de mortos no trânsito brasileiro que disponho é de 2019 e ainda preliminar: 30.371.

Se for isto, temos de deixar claro que nosso objetivo para 2030 será diminuir em 50% este número, correto?

Precisaremos, então, saber quais são os números de vítimas de cada estado e de cada município brasileiro. Todos estes números estão no banco de dados do Datasus, do Ministério da Saúde e disponíveis para qualquer interessado, mas este necessita de conhecimento extra para poder extrair os dados do Sistema Tabnet para publicá-los com segurança.

Apesar de insistência de especialistas do trânsito há mais de 10 anos, até hoje o Ministério não oferece qualquer facilidade para a obtenção destes dados. Para complicar ainda mais, alguns sites publicavam os dados estatísticos fornecidos pelo DPVAT cujo levantamento é feito com base nos pedidos de indenização por parte das vítimas de sinistros, e por isto obviamente são diferentes dos do Ministério da Saúde.

Esta é uma situação que precisa ser corrigida pelo Ministério/Datasus se, efetivamente, estamos buscando um sistema coerente de informação de utilidade pública. A solução é simples: basta criar um espaço no portal do Ministério da Saúde para Estatísticas de Sinistros de Trânsito e colocar ali todas as informações levantadas pelo Datasus para que cada interessado possa copiar o que precisar e sem complicações técnicas.

Uma vez informados quais são os dados de cada município ficará mais fácil para seus administradores definirem o que devem fazer para atingir suas metas e como acompanhá-las durante o período da década. Isto permitirá ao mesmo tempo monitorar o trabalho paulatino de cada estado da Federação e, por fim, do próprio país.

Se queremos chegar no fim da década com bons números será indispensável acompanhar ano-a-ano qual o desempenho nacional.

Tenho convicção de que se contarmos com a boa vontade do governo federal para coordenar ações regionais pelo país e gerar dados que permitam a estados, municípios, instituições públicas, privadas e organizações voluntárias que tenham acesso a dados e informações sobre o que deve ser feito para atingir a meta da 2ª Década Mundial de Ações de Trânsito, a mobilização tem tudo para oferecer bons resultados.

Na medida em que formos progredindo paulatinamente, iremos também melhorando nosso desempenho coletivo e, assim, envolvendo outros setores da sociedade para se juntar ao movimento.

O jogo é simples: podemos ficar reclamando indefinidamente da inércia do setor e não sairmos do lugar ou podemos, todos, fazer parte de uma mobilização que vai levar o país a um lugar de destaque no cenário mundial e, enfim, orgulhar nossa sociedade de que, claro, somos capazes de atingir resultados incríveis. Basta que se nos ofereçam as condições mínimas para ir à luta. É pegar ou largar!

*J. Pedro Corrêa é Consultor em Programas de Segurança no Trânsito

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