CNH sem autoescola não resolve: risco é ampliar número de condutores sem preparo
Ao priorizar a redução de exigências para a CNH, o governo deixa de enfrentar os dois principais gargalos da segurança viária: a fiscalização e a educação no trânsito.

A proposta do governo federal de flexibilizar as regras para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) volta a gerar debates e críticas de especialistas em segurança viária. O argumento oficial tem sido o de que o processo atual representa um custo social elevado e dificulta o acesso de milhares de brasileiros, sobretudo os de menor renda, ao documento de habilitação. No entanto, estudos recentes mostram que o verdadeiro problema não está nos custos ou na burocracia, mas sim na falta de preparação e na ausência de fiscalização eficaz.
Um levantamento realizado pela Fundación MAPFRE, em parceria com o Instituto Brasileiro de Segurança no Trânsito (IST), revelou que apenas 30% dos motociclistas aprenderam a pilotar em uma autoescola. Em contrapartida, mais de 60% iniciaram a prática de forma informal, orientados por familiares, amigos ou até sozinhos, sem acompanhamento técnico ou pedagógico. Esse dado escancara uma realidade preocupante: a maior parte dos condutores de motocicletas no Brasil começa sua trajetória sem nenhum tipo de preparo formal.
A informalidade e seus riscos
Ainda de acordo com a pesquisa, 12% dos motociclistas sequer possuem a categoria A da CNH, índice que cresce nas regiões Norte e Nordeste. Isso significa que mais de um em cada dez condutores circula pelas vias públicas de forma completamente irregular, sem a habilitação exigida por lei. O estudo também revelou que 22% começaram a pilotar antes da idade legal permitida, o que reforça a fragilidade da fiscalização.
Esses números enfraquecem o discurso de que o problema do acesso à habilitação é exclusivamente econômico. O que se observa é que, mesmo sem os custos das autoescolas, milhares de pessoas já circulam sem habilitação, colocando em risco não apenas a própria vida, mas também a de terceiros. A questão central, portanto, não é reduzir exigências, mas garantir que todos tenham acesso a uma formação segura e que as regras sejam cumpridas.
O impacto da formação deficiente
Segundo especialistas em trânsito, a flexibilização proposta pelo governo pode abrir caminho para um cenário ainda mais grave: o aumento do número de motociclistas sem qualquer preparo técnico. Para o educador e especialista em trânsito Celso Mariano, a medida representa um retrocesso perigoso:
“Não se trata de baratear ou encurtar o processo. O Brasil já convive com uma realidade de motociclistas mal preparados. A flexibilização vai apenas legitimar essa informalidade e transformar um problema social em uma tragédia anunciada”, alerta.
O especialista destaca ainda que o custo dos acidentes é infinitamente maior do que o custo de uma formação de qualidade. Apenas em 2023, segundo o Ipea, os acidentes com motociclistas geraram bilhões em perdas econômicas e sobrecarga para o Sistema Único de Saúde (SUS).
Fiscalização e educação: os pontos esquecidos
Ao priorizar a redução de exigências para a CNH, o governo deixa de enfrentar os dois principais gargalos da segurança viária: a fiscalização e a educação no trânsito. Se quase um quarto dos motociclistas começa a pilotar antes da idade legal, isso evidencia falhas graves no controle. Se mais de 10% circulam sem CNH, isso mostra ausência de fiscalização efetiva.
Além disso, ao flexibilizar o processo de habilitação, corre-se o risco de desvalorizar o papel das autoescolas, que são os espaços destinados à aprendizagem com base em pedagogia, técnica e respeito à legislação. Diminuir sua relevância equivale a aceitar que dirigir ou pilotar é algo que se aprende “na prática”, quando, na verdade, exige conhecimento, responsabilidade e preparo.
CNH sem autoescola: um caminho oposto ao da segurança
O Brasil ocupa posição de destaque negativo nos índices mundiais de mortalidade no trânsito, e os motociclistas estão entre as principais vítimas. Diante desse cenário, medidas que reduzam a qualidade da formação parecem caminhar na contramão dos compromissos de segurança assumidos pelo país em pactos internacionais, como a Década de Ação pela Segurança no Trânsito da ONU.
Especialistas são categóricos ao afirmar: flexibilizar não resolve. Ao contrário, amplia o contingente de motociclistas sem preparo e sem condições adequadas de enfrentar os riscos diários do tráfego. O verdadeiro debate deveria estar centrado em como tornar a formação mais acessível sem abrir mão da qualidade. Além disso, em como reforçar a fiscalização para coibir a circulação de condutores irregulares.
Enquanto isso não acontece, a cada dia mais motociclistas ingressam nas ruas e estradas sem o preparo mínimo necessário. Uma conta que, como lembram os especialistas, é paga por toda a sociedade.

Um retrocesso no processo ensino aprendizagem em se tratando de técnicas para dirigir, muitos pensam que dirigir é girar a chave do carro e colocar em movimento, mas dirigir é responsabilidade com aquilo que faz perante si e aos outros no espaco público transito. Lamentável ver que a Educação para o Trânsito ainda não tem seu devido valor nas discussões .
Salário mínimo R$ 1600, CNH R$ 2600, é cada dia o rico ficando mais rico e o pobre mais pobre.
Avaliação perfeita e coerente. O grande problema do trânsito no Brasil é a falta de fiscalização. Fiscalização só acontece, quando acontece, em vias principais. A fiscalização tem que entrar nos bairros. Os custos podem e devem ser reduzidos, mas tem que ser avaliados os custos de manutenção do CFC com qualidade e rever as tarifas dos Detrans.