Menos horas, mais flexibilidade: o que muda com o CNH do Brasil
Publicada no DOU, a Resolução 1.020/25 muda profundamente o processo da CNH. Veja por que especialistas alertam para riscos na formação.

A tão aguardada — e ao mesmo tempo temida — Resolução 1.020/25 do Contran será publicada no Diário Oficial da União após o lançamento do programa CNH Brasil, que ocorreu hoje (09/12) trazendo a maior reestruturação na formação de condutores desde que o modelo atual foi criado. Trata-se de uma mudança profunda, que substitui totalmente a Resolução 789/20 e inaugura um sistema mais flexível, com menos exigências e mais liberdade ao candidato que quer tirar a CNH.
Entre os objetivos declarados, estão a “desburocratização”, a “acessibilidade” e a “focalização na competência prática e teórica” do candidato. No entanto, a redução de requisitos e a abertura para novos provedores levantam dúvidas importantes — e justificadas — para quem atua diariamente na segurança viária.
“Flexibilizar não pode ser sinônimo de fragilizar”, observa o especialista Celso Mariano, diretor do Portal do Trânsito.
“Há riscos quando se mexe nas bases de um processo tão sensível quanto a formação do futuro motorista.”
A seguir, o Portal do Trânsito apresenta uma análise detalhada e ponto a ponto de tudo o que muda, o que permanece e o que ainda depende de regulamentação.
Processo de Habilitação: prazo indeterminado e ordem flexível
A primeira ruptura é estrutural. A Resolução 789/20 previa um processo válido por 12 meses, com etapas rígidas: psicotécnico → exame médico → curso teórico → prova teórica → aulas práticas → exame prático.
A Resolução 1.020/25 elimina ambos:
- o processo passa a ter validade indeterminada;
- a ordem das etapas deixa de ser obrigatória, permitindo, por exemplo, iniciar o curso teórico antes mesmo do exame médico.
Embora isso amplie a autonomia do candidato, especialistas temem perda de coerência pedagógica. A avaliação de aptidão física e mental, por exemplo, deixaria de ser pré-requisito para o início da formação.
Curso teórico: fim da carga horária mínima e multiplicidade de provedores
O que muda:
- Não existe mais carga horária mínima.
O antigo padrão de 45 horas-aula desaparece. Cada provedor poderá definir duração, formato e metodologia. - Cresce o número de instituições autorizadas, além dos CFCs:
- União (curso EaD próprio do órgão máximo executivo de trânsito)
- autoescolas
- entidades especializadas em EaD
- Escolas Públicas de Trânsito
- órgãos do SNT
- Critério de conclusão pode combinar presença, avaliações ou interação.
A diversidade pode incentivar inovação pedagógica, mas também abre margem para cursos ultracurtos oferecidos com foco apenas em aprovar — e não formar — o futuro condutor.
“Um curso rápido demais tende a ser raso demais”, alerta Celso Mariano.
Aulas práticas: redução radical de 20 para 2 horas
Poucas áreas sofreram impacto tão expressivo quanto as aulas práticas. O mínimo antes era 20 horas-aula para categorias A e B. Agora passa a ser 2 horas-aula. Para ACC, nem isso: a norma dispensa completamente aulas práticas obrigatórias.
Além disso:
- Instrutores podem ser autônomos, e não apenas vinculados aos CFCs.
- O veículo pode ser do candidato, sem exigência de duplo comando, sem adaptações e com identificação mínima e removível.
- CFCs deixam de ser protagonistas exclusivos na prática.
Essa mudança toca diretamente na essência da formação. Na prática, o Brasil passa a ter um modelo em que o treino supervisionado pode ser mínimo. E mais: realizado em veículos sem duplo comando — algo que especialistas consideram tecnicamente imprudente.
Exames: banco público de questões e critério objetivo na prova prática
Exame teórico:
- Continua com 30 questões.
- Aprovado com 20 acertos.
- Questões passam a vir exclusivamente do Banco Nacional de Questões unificado.
- Modalidade pode ser presencial, on-line ou híbrida, com monitoramento remoto.
Exame prático:
- Sai o sistema de faltas subjetivas; entra o modelo baseado nas infrações do CTB.
- O candidato acumula pontos de acordo com a gravidade da infração.
- Aprovado se não ultrapassar 10 pontos.
- Comissão avaliadora pode atuar com apenas um membro ou remotamente.
Esse ponto divide opiniões. O critério objetivo tende a dar mais transparência, mas a tolerância maior pode permitir que candidatos concluam a prova cometendo infrações significativas.
Mudança e adição de categoria também ficam mais curtas
- Curso prático para mudança para C, D e E reduzido de 20 para 10 horas-aula.
- Adição de categoria A ou B reduzida para 2 horas-aula, espelhando a 1ª habilitação.
PDL do Coronel Meira: tentativa de sustar a resolução
Logo após a divulgação da resolução, no início da semana, o deputado federal Coronel Meira protocolou um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) buscando sustar os efeitos da Resolução 1.020/25. O argumento central é que a norma extrapola limites regulatórios, fragiliza a formação de condutores e gera insegurança jurídica ao alterar drasticamente o papel dos CFCs.
O PDL tende a ganhar força no Congresso, especialmente entre parlamentares que defendem maior participação dos estados e mais debate técnico antes de alterações profundas no processo da CNH.
Posicionamento dos Detrans: transição gradual e manutenção das regras atuais
Após a repercussão inicial da Resolução 1.020/25, os Detrans passaram a adotar uma postura de cautela e orientação ao público — e o movimento ganhou ainda mais clareza após reunião realizada nesta semana pelo Detran do Paraná. A diretoria de operações do órgão detalhou que, caso a nova resolução seja publicada, a implementação não será imediata e tampouco retroativa, estabelecendo diretrizes que tendem a ser seguidas também por outros Detrans do país.
Conforme o Detran/PR, processos já abertos continuarão valendo exatamente como estão, sem qualquer alteração ou necessidade de cancelamento. Pelo contrário: o órgão reforça que não é permitido cancelar processos ativos para reabri-los sob um eventual novo modelo, caso a resolução venha a vigorar.
Além disso, o Paraná adiantou um ponto central: mesmo com a previsão de flexibilização nacional, as 45 aulas do curso teórico seguirão sendo exigidas por, no mínimo, 180 dias, independentemente de mudanças em portarias federais. Esse período de transição será usado, segundo o órgão, para adequações internas, revisão operacional e discussão aprofundada sobre itens que ainda dependem de regulamentação.
Na prática, a estrutura dos Centros de Formação de Condutores permanece intacta. Nada muda, por ora, em termos de quadro de diretores, instrutores ou funcionamento dos CFCs, afastando rumores sobre alterações imediatas no modelo de credenciamento ou no papel das autoescolas.
Quanto às aulas práticas, o Detran/PR informou que, durante o período de adaptação, continuará exigindo quantidades mínimas claras e com biometria obrigatória:
- Categoria B: 2 aulas práticas obrigatórias com biometria
- Categoria A: 2 aulas práticas obrigatórias com biometria
- Categorias C, D e E: 10 aulas práticas obrigatórias com biometria
Outro ponto reforçado diz respeito ao exame toxicológico. O órgão lembra que o toxicológico é previsto em lei federal, e, portanto, não depende da resolução — mantém-se obrigatório nos casos previstos pelo CTB, independentemente de mudanças no processo de habilitação.
De forma geral, o Detran/PR sinaliza um movimento de prudência: 180 dias de transição devem servir para ajustes, esclarecimentos, definições técnicas e discussão conjunta com outros estados. A tendência é que essa postura — de continuidade das regras atuais até que novas diretrizes sejam plenamente regulamentadas — seja replicada por outros Detrans, evitando rupturas bruscas e garantindo segurança jurídica aos candidatos e à rede de CFCs em todo o país.
Medida Provisória do Bom Condutor: o que muda com o lançamento da CNH Brasil
Junto com a publicação da Resolução 1.020/25, o governo federal anunciou a Medida Provisória do Bom Condutor, que cria um conjunto de incentivos voltados a motoristas que mantêm histórico limpo no trânsito. A MP faz parte do pacote do programa CNH Brasil e traz três eixos principais:
1. Estímulo ao bom condutor: renovação automática sem exame médico
A proposta cria um mecanismo de renovação automática da CNH para motoristas que:
- não tenham cometido infrações de trânsito no período de validade da carteira;
- mantenham dados cadastrais atualizados;
- não apresentem restrições no prontuário.
Para esses condutores, não será necessário comparecer ao Detran para a renovação — e, em alguns casos, nem realizar novo exame médico, desde que atendam aos critérios estabelecidos pelo governo federal.
A lógica é simples: premiar quem dirige com responsabilidade e não gera custos ao sistema de fiscalização e saúde pública.
2. Redução de 40% no custo dos exames médico e psicológico
Outro ponto central da Medida Provisória é a redução de até 40% nos valores dos exames de aptidão física, mental e avaliação psicológica, aplicáveis tanto:
- na primeira habilitação, quanto
- na renovação da CNH.
Segundo o governo, essa diminuição virá por meio de parâmetros nacionais unificados, revisão dos modelos de credenciamento e estímulo à concorrência regulada.
A medida busca tornar o processo mais acessível Medida Provisória do Bom Condutor: o que muda com o lançamento da CNH Brasil
Junto com a publicação da Resolução 1.020/25, o governo federal anunciou a Medida Provisória do Bom Condutor, que cria um conjunto de incentivos voltados a motoristas que mantêm histórico limpo no trânsito. A MP faz parte do pacote do programa CNH Brasil e traz três eixos principais:
1. Estímulo ao bom condutor: renovação automática sem exame médico
A proposta cria um mecanismo de renovação automática da CNH para motoristas que:
não tenham cometido infrações de trânsito no período de validade da carteira;
mantenham dados cadastrais atualizados;
não apresentem restrições no prontuário.
Para esses condutores, não será necessário comparecer ao Detran para a renovação — e, em alguns casos, nem realizar novo exame médico, desde que atendam aos critérios estabelecidos pelo governo federal.
A lógica é simples: premiar quem dirige com responsabilidade e não gera custos ao sistema de fiscalização e saúde pública.
2. Redução de 40% no custo dos exames médico e psicológico
Outro ponto central da Medida Provisória é a redução de até 40% nos valores dos exames de aptidão física, mental e avaliação psicológica, aplicáveis tanto:
na primeira habilitação, quanto
na renovação da CNH.
Segundo o governo, essa diminuição virá por meio de parâmetros nacionais unificados, revisão dos modelos de credenciamento e estímulo à concorrência regulada.
A medida busca tornar o processo mais acessível sem, segundo o governo, comprometer a segurança viária.
3. Fim da obrigatoriedade da CNH física
A MP também elimina a exigência de emissão do documento físico. A partir da implantação do novo modelo, a CNH Digital passa a ser o documento oficial, dispensando impressão em papel ou cartões com QR Code.
A versão física continuará existindo como opção, mas não será mais obrigatória.
A promessa é de economia para os Detrans, padronização nacional e maior integração com sistemas eletrônicos de fiscalização. Isso sem, segundo o governo, comprometer a segurança viária.
3. Fim da obrigatoriedade da CNH física
A MP também elimina a exigência de emissão do documento físico. A partir da implantação do novo modelo, a CNH Digital passa a ser o documento oficial, dispensando impressão em papel ou cartões com QR Code.
A versão física continuará existindo como opção, mas não será mais obrigatória.
O que esperar agora?
Com a publicação da Resolução 1.020/25, o Brasil entra oficialmente em um novo paradigma de formação de condutores. A promessa é de democratização e redução de custos. O risco — apontado por diversos especialistas — é que a flexibilização excessiva reduza a qualidade técnica dos novos motoristas e pressione ainda mais os índices de sinistros no trânsito brasileiro.
Como resume Celso Mariano:
“Formar um condutor não é apenas ensinar regras. É desenvolver responsabilidade. Quando o processo fica curto demais, essa responsabilidade pode se perder.”
O Portal do Trânsito seguirá acompanhando a implementação da nova norma, o andamento do PDL e as reações dos Detrans, trazendo atualizações sempre que houver novos desdobramentos.
