Projeto da Senatran extingue Detrans e transfere habilitação para aplicativos: desburocratização ou risco à segurança?
Especialista questiona se eliminar toda a etapa de formação e transformar a habilitação em um serviço por aplicativo é realmente desburocratizar?
* Por Alisson Maia

Um projeto em elaboração pela Senatran (Secretaria Nacional de Trânsito) que está em fase de consulta publica, propõe extinguir os Detrans em todo o Brasil e centralizar o processo de habilitação em aplicativos, empresas privadas e EaD.
Na prática, a proposta promete “modernizar e simplificar” o acesso à Carteira Nacional de Habilitação (CNH), mas levanta questionamentos sérios: será que isso realmente reduzirá os custos para os candidatos? E será que desburocratizará o processo ou apenas criará novas armadilhas?
Segundo o texto, o candidato abriria o processo diretamente em um aplicativo da Senatran (Art. 13) e seria encaminhado para uma plataforma de curso online (Art. 18, II). Esse curso, porém, não teria carga horária mínima (Art. 19, §1º) e a própria empresa responsável aplicaria a avaliação do aluno (Art. 20, §1º), sem controle público de qualidade. Na sequência, os exames médicos e psicológicos também seriam agendados em apps credenciados pela Senatran (Art. 89), embora os critérios técnicos ainda não estejam definidos (Art. 28).
A prova teórica seria aplicada de forma remota, de onde o candidato quisesse, por meio de aplicativo (Art. 30, II, c). Ou seja, todo o processo ficaria restrito a plataformas digitais, aumentando os riscos de fraude e reduzindo a fiscalização presencial.
O ponto mais crítico, entretanto, está no exame prático.
O candidato poderia marcar a prova de direção sem ter feito nenhuma aula de volante (Art. 32, §3º). O exame poderia ocorrer no carro do próprio aluno (Art. 40) e ser conduzido por “prepostos” terceirizados (Art. 39, §2º e §6º), apenas monitorados eletronicamente (Art. 39, §4º).
Isso significa o fim da obrigatoriedade dos veículos de autoescola, que hoje contam com pedais duplos e identificação visual para alertar outros motoristas de que há um aprendiz ao volante.
A proposta simplesmente retira do processo os principais instrumentos de segurança pedagógica que foram construídos ao longo de décadas.
Outro aspecto polêmico é a previsão de reteste ilimitado: caso reprovado, o candidato poderia repetir a prova quantas vezes quisesse no mesmo dia, desde que pagasse novamente a taxa (Art. 42, §2º). Na prática, isso pode significar mais custos, não menos.
Um candidato despreparado, sem aulas teóricas e práticas, terá grande chance de reprovar várias vezes — o que representaria mais gastos e mais frustração. Tudo isso causaria a extinção dos Detrans, os órgãos estaduais deixariam de arrecadar, de abrir processos e de gerir todo o ciclo de formação de condutores. Em vez de servidores com fé pública, responsáveis por fiscalizar e aplicar provas, surgiriam examinadores civis, contratados por empresas privadas e sem o mesmo grau de
responsabilidade institucional.
Sem receita própria, os Detrans ficariam inviabilizados financeiramente, o que comprometeria não apenas o setor de habilitação, mas também toda a fiscalização de trânsito e os demais deveres que hoje competem aos órgãos estaduais.
Esse esvaziamento institucional fragilizaria ainda mais a segurança viária no Brasil.
Sem recursos e sem estrutura, os Detrans deixariam de ter condições de manter programas de fiscalização, operações educativas e políticas de controle do trânsito. Em resumo, o projeto reduz a função do Estado a um mero emissor de documentos digitais, terceirizando toda a formação para empresas privadas e transformando a CNH em um produto de prateleira.
O discurso oficial fala em modernização e desburocratização. Mas será que eliminar toda a etapa de formação e transformar a habilitação em um serviço por aplicativo é realmente desburocratizar? Ou apenas transferir responsabilidades do Estado para empresas privadas, deixando a sociedade à mercê de um processo frágil, caro e arriscado?
Em um país que registra mais de 30 mil mortes anuais no trânsito, extinguir a educação formal dos condutores pode ser um retrocesso com consequências graves. A CNH não pode se tornar apenas mais um produto digital: ela precisa continuar sendo resultado de um processo sério de aprendizado, fiscalização e responsabilidade pública.
O que se propõe, no fim das contas, é apenas emitir documento e entregar a CNH ao brasileiro sem formação adequada, sem avaliação real e sem a mínima garantia de segurança. Perigo!
*Alisson Maia é advogado, especialista em Gestão em Educação e Segurança no trânsito

Certíssimo! Parabéns 👏🏼
É um tipo no pé, uma abertura para essas empresas particulares ” criarem dificuldades para venderem facilidades ” além de formar uma geração de motoristas sem compromisso com as regras e segurança de
trânsito .
A ideia do APP é boa e poderia ser oferecido e administrado pelo próprio Detran de cada estado.
Bom dia, gostaria de deixar claro meu posicionamento referente esta questão.
Sou a favor do fim dos CFC’s, haja visto terem sido tornado uma maquina de fazer dinheiro sem contar que os instrutores na sua grande maioria não ensina nenhum candidato realmente a dirigir e sim como a passar nas avaliações, uma completa falta de comprometimento. Essa falta de comprometimento dos “profissionais” faz com que os CFC’s deixam de ser vistos como uma instituição de ensino o que a torna dispensável. Porém o fim dos CFC’s deve ser realizado de forma gradual ao mesmo tempo que a matéria trânsito seja incluida nas instituições de ensino publico ou privado iniciando na pré escola conforme preconiza o capitulo VI da Lei 9.503/97 que trata da educação no trânsito, inclusive esse foi o tema do meu TCC numa pós graduação. Eu como operador de segurança publica, instrutor de trânsito tenho convicção de que a unica forma de diminuirmos as estatisticas que acredito ser maior do que as publicadas é investindo na educação para o trânsito. Como dito anteriormente a inclusão da matéria no ensino publico ou privado além de aumentar o conhecimento do candidato a habilitação o que no CFC’s é insignificante, diminuiria também o custo da CNH, pois ao concluir o nivel médio a candidato estaria apto a realizar uma avalição junto ao orgão executivo de transito no estado em que reside sem nenhum custo, posteriormente poderia realizar aulas de pratica veicular com instrutores credenciados os quais poderiam comunicar o departamento que o canditado se encontra apto a conduzir um veiculo na via publica. Esse processo simtraria umbaixo custo ao canditado a primeira habilitação. Em fim a proposta atual do referido governo tem como base ao meu ver provocar o caos social através do aumento da estatisticas relacionadas a sinistros causados por condutores despreparados. Esse governo deve ter esquecido que estamos na 2ª DECADA DE AÇÃO PARA SEGURANÇA NO TRÂNSITO, que tem por objetivo reduzir o numero de sinistros e não aumentar. Só lembrando o veiculo na mão de um condutor despreparado é uma arma.
Dr vivemos isso com o simulador, fomos obrigados a investir e hoje tenho dois jogados em uma sala com prejuízo de 80 mil, esse novo modelo o estado não tem estruturar para realizar visto a dificuldade que tem hoje com modelo dos CFCs !!!
Como médica credenciada pelo Detran há 24 anos, acho um absurdo esta mudança. O trânsito é um risco muito sério e o motorista tem que ser melhor avaliado. Devemos desburocratizar mas com responsabilidade.
Ler tudo isso parece que a formação será totalmente fantasiosa, infelizmente quem acha que vai ficar melhor esta enganado, as reprovações serão enormes , os acidentes aumentarão e muito. E as taxas continuam , não acredito que o Detran fique sem função. O prejuízo será com as diversas vidas perdidas, e um Retrocesso na educação do trânsito.