Coronavírus: lições da pandemia para o trânsito brasileiro
A pandemia deixará dentre as tantas lições para as relações no trânsito, o legado de que “cuidar de nós é cuidar dos outros”. Leia a reportagem de Pauline Machado.
A pandemia trouxe uma grande mudança na vida de todos, passando pela necessidade de restringir atividades comerciais, educacionais, eventos, jogos e até o número de pessoas nas ruas. Tudo isso está causando um impacto significativo na mobilidade urbana. Cada vez mais os usuários estão repensando formas de continuar utilizando os meios de transporte e, também, as empresas têm repensando seus conceitos para encontrar uma alternativa ainda mais segura para seus clientes.
Com isto, a redução no número de veículos em circulação nas vias públicas tem melhorado o trânsito. Por outro lado, refletiu no aumento de veículos transitando em excesso de velocidade ocasionando acidentes graves.
De acordo com o advogado Cristiano Baratto, presidente do Instituto de Estudos de Transporte e Logística (IET), neste período da pandemia há uma orientação do CONTRAN – Resolução 782/2020 – que suspende ou interrompe prazos de autuações, defesas, recursos, e todas as medidas dos órgãos de fiscalização de trânsito.
No entanto, tais medidas, segundo Baratto, podem ser equivocadamente compreendidas pelos condutores como liberdade.
“As vias públicas continuam sendo monitoradas, mas pela suspensão de notificações, muitos podem interpretar isso como uma sensação equivocada de impunidade, porque passam por um local que tem radar e nada ocorre, então acreditam que podem elevar a velocidade porque nada lhe será imputado. Lamentavelmente muitos condutores apenas cumprem leis de trânsito porque a multa pesa no bolso, não pensam na responsabilidade de todos em cooperação para um trânsito mais seguro”, ressalta.
Reflexos na mobilidade urbana
Antes mesmo da pandemia, a mobilidade urbana já vinha experimentando importantes mudanças ao longo dos anos. Quando se fala em transporte, por exemplo, os jovens atualmente buscam pela comodidade de utilizar aplicativos de transporte e não mais pela aquisição de um carro, observa o presidente do IET. “Também é possível observar a utilização de bicicletas, patinetes como uma forma de unir saúde física e mental, e agora, evitar o transporte coletivo, foco de transmissão do coronavírus. Ainda existem bicicletas elétricas que dão um importante conforto aos ciclistas, com inovações e preços sendo reduzidos pelo domínio de tecnologias e a concorrência das indústrias de e-bickes”, ilustra.
Desafios pós-pandemia
Com a necessidade de um distanciamento social, os aplicativos de transporte que vinham sendo muito utilizados para se chegar mais rápido ao destino com um custo mais baixo, assim como os demais meios de transportes, precisaram se reinventar.
Os usuários tiveram que se adaptar aos novos desafios impostos pela pandemia, sobretudo em seguir as normas e manter os cuidados de higiene e segurança, já que várias pessoas compartilham o mesmo meio de transporte.
Da mesma forma, os contratos de concessão do transporte público deverão repensar os custos para novas licitações, pensando no investimento de mais ônibus em circulação para manter poucos usuários no interior e evitar que se torne um meio de transmissão de doenças com o volume de pessoas que utilizam transporte coletivo, considera, Cristiano Baratto.
“Penso que temos que ver o lado bom de tudo e a pandemia pode ser uma oportunidade de reflexão, sobre o que pensamos, o que somos, o que precisamos para viver, uma oportunidade de nos conhecermos melhor. O home-office, por exemplo, poderá ser um caminho sem volta, assim como os eventos, que têm sido realizados de forma virtual com a mesma qualidade que os eventos presenciais. Isto é uma grande mudança de paradigma que todos estão experimentando por obrigação, mas que passará a fazer parte do nosso dia a dia mesmo após a pandemia. Tudo isso continuará contribuindo para a redução do fluxo em vias públicas e a um trânsito melhor”, avalia.
O maior legado
Contudo, a pandemia deixará dentre as tantas lições para as relações no trânsito, o legado de que “cuidar de nós é cuidar dos outros”, ou seja, e estamos mesmo, todos juntos, reflete o advogado.
“Não se trata de mero discurso ou previsão da legislação. Todos estamos no mesmo barco, ricos e pobres, famosos ou anônimos. Todos precisam cuidar de sua saúde, e se contraírem o Covid têm o mesmo receio de não saber se encontrarão um leito disponível e de contar com a sorte do seu organismo enfrentar esta doença que ainda não tem cura. Se potencializássemos esta visão para o trânsito seria maravilhoso, todos educados e respeitando normas para evitar causar acidentes. Acredito que parcela da sociedade brasileira será sensibilizada e poderá estender esta experiência para outras práticas, inclusive em prol de um trânsito mais seguro”, espera.