Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nossos sites, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao acessar o Portal do Trânsito, você concorda com o uso dessa tecnologia. Saiba mais em nossa Política de Privacidade.

05 de outubro de 2024

Estacionamentos privados: quem fiscaliza?


Por Pauline Machado Publicado 16/09/2022 às 11h15 Atualizado 08/11/2022 às 21h03
Ouvir: 00:00

Existe alguma regra para determinação de preços? Há normas padronizadas para esse tipo de estabelecimento? O Portal do Trânsito foi atrás dessas e outras respostas!

Nas grandes cidades não é preciso andar com os olhos atentos para observar o elevado número de estacionamentos privados terceirizados. Ainda mais quando se trata de locais rodeados por empresas, comércios e estabelecimentos de ensino, por exemplo.

De acordo com informações da Associação Brasileira de Estacionamentos – Abrapark, em 2018 – período em que o último levantamento foi realizado, o Brasil  registrava cerca de 40 mil empresas de estacionamentos.

No entanto, poucos são os que sabem sobre as regras que fiscalizam tais atividades.

Para esclarecer algumas dúvidas sobre este assunto, conversamos com exclusividade com o especialista em Direito de Trânsito, Rene Dias.

Acompanhe a entrevista!

Portal do Trânsito – O que diz a legislação sobre a terceirização de estacionamentos?

Renê Dias – A terceirização de estacionamentos privados refere-se à colaboração entre um proprietário de terreno no qual se dispõe a adaptá-lo a receber e manter a guarda de veículos com uma empresa especializada na operação desse serviço. Também se refere a empreendimentos que tenham outra finalidade. Por exemplo, comércio, indústria, estádios de futebol, etc…, que tenham ou disponibilizem uma parte do seu espaço interno para a guarda de veículos. E, além disso, ofereçam a uma empresa especializada na operação desse serviço. Realiza-se essa atividade geralmente sob a paga de valores por período de uso.

Por se tratar de espaço privado, o qual é explorado para fins comerciais (estacionamento pago), a legislação aplicada é atinente ao direito civil. Primeiramente, o negócio jurídico é regido por um contrato, que terá suas bases nos artigos 421 ao 853 da Lei nº 10.406, de 2002 (Código Civil).

A utilização do espaço e as regras de permanência pelos veículos serão estabelecidas formalmente entre o proprietário do local e o gestor da empresa terceirizada (prestadora do serviço). Não há uma regra geral nacional que estabeleça, por exemplo, o tempo mínimo ou máximo de permanência. O que geralmente se aplica, refere-se às medidas fracionadas, para fins de cobrança, o tempo de 60 (sessenta) minutos. Ou seja, a cada tempo fracionado, recomeça a contagem para novo valor de permanência, tendo o mesmo valor da primeira, nessas frações subsequentes.

Não há uma norma federal regulamentando as condições e padrões de oferecimento e cobrança desses serviços por empresas terceirizadas, pois, isso certamente feriria o princípio constitucional da livre iniciativa e livre concorrência (art. 170 da Constituição Federal).

Desta forma, as regras legais que regulamentam a atividade de estruturação de prestação de serviços de estacionamento por meio de terceirização são o Código Civil e para a realização do trabalho e operação e o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 1990).

Portal do Trânsito – Quais critérios mínimos os empreendimentos devem ter ao definir o início desse projeto?

Rene Dias – No que se trata da localização e do tamanho do estacionamento, esses são quesitos puramente de estratégia comercial, dado que não há uma regulamentação direta e específica que desenhe a estrutura mínima de um empreendimento. Basta que sejam resultado de um estudo de mercado, considerando a concorrência da região.

Os estacionamentos privados são serviços que dependem de outras atividades para que sejam lucrativos. Desta forma, o proprietário escolhe locais com grande fluxo de pessoas, no qual haverá fácil acesso para os clientes.

A única regra pública a ser observada nos empreendimentos é a Lei nº 13.146, de 2015, que trata da inclusão da pessoa com deficiência. Esta norma estipula que estacionamentos públicos e privados devem reservar no mínimo 2% das vagas disponibilizadas no empreendimento para pessoas com deficiência de mobilidade. Ressalta-se na disposição da norma que, no caso de locais com capacidade para menos de 100 veículos, há a obrigatoriedade de ser reservada, no mínimo, uma vaga para esse público especial.

Quanto à estrutura da vaga para deficientes, esta deve estar próxima ao acesso de circulação de pedestres. O local, conforme a ABNT:NBR-9050, deve medir 2,5m x 5m (2,5 metros por 5 metros). E, também, possuir uma faixa branca com largura de 1,20 metro e comprimento igual ao da vaga, que precisa permitir o embarque e o desembarque. Além dessas especificações, o local deve respeitar as determinações previstas na Resolução Contran nº 965, de 2022. Além disso, a sinalização e identificação nos termos da Resolução Contran nº 973, de 2022.

Portal do Trânsito – Quais cuidados as empresas devem ter no momento da busca, da seleção pela empresa terceirizada?

Rene Dias – Para a gestão de um estacionamento privado é preciso se preocupar com toda a infraestrutura do local, sistemas de segurança, treinamento de pessoal e acompanhar as inovações tecnológicas para ter um serviço de boa qualidade.

A empresa terceirizada adequada a realizar o trabalho é aquela capaz de utilizar o estacionamento, otimizando ao máximo o espaço físico demarcando de maneira correta. E, também, reservando os espaços de direito (ao idoso e ao deficiente). Isto pode ser feito por meio de um processo de revitalização do local para que atenda às necessidades do contratante.

Além da remarcação das vagas, instalação de equipamentos de controle com colocação de cancelas nas entradas, a colocação de câmeras de segurança e o relógio demarcador de horário em local visível são diferenciais que qualificam a prestação de serviço pela empresa terceirizada. A terceirizada que propuser todas as melhorias certamente realizará o melhor desempenho possível.

Portal do Trânsito – Quando se terceiriza o serviço de estacionamento, os funcionários e respectivos treinamentos devem ficar a cargo de quem? Por quais motivos?

Rene Dias – Como já foi dito anteriormente, por se tratar de espaço privado com exploração para fins comerciais (estacionamento pago), aplicam-se os termos do direito civil, sendo o negócio jurídico regido por contrato com manifestação de vontades.

No contrato, serão especificadas as disposições do direito das obrigações, previstos no art. 233 ao 285 do Código Civil, ou seja, mediante o contrato estabelecido entre as partes (proprietário do terreno e empresa terceirizada) ficará estabelecida a responsabilidade para o treinamento dos funcionários. Isso dependerá muito do que ambos quiserem conforme o tipo de prestação de serviço.

Caso o proprietário ofereça tão somente o terreno e a estrutura física para a prestação do serviço, certamente caberá à terceirizada capacitar e treinar os funcionários. A qualidade do serviço e todas as disposições legais trabalhistas cabe a ela. Mas, se o local for parte integrante de outro empreendimento (comércio, indústria, serviços, ensino, shoppings, estádios de futebol, etc.) a situação é diferente. Além das atividades de praxe, como o atendimento ao público idoso ou deficiente, por exemplo, o empreendimento poderá oferecer à terceirizada, outros cursos e treinamentos referentes ao atendimento ao público de cada estabelecimento. Tudo dependerá do serviço realizado e também do local onde estará instalado o estacionamento.

Portal do Trânsito – De modo geral o que deve constar no contrato e qual é a indicação de vigência mínima contratual?

Rene Dias – O negócio jurídico entre as pessoas física ou jurídica, para terceirização do serviço de estacionamento, é um acordo de vontades no qual poderão se estabelecer quaisquer regras lícitas e exequíveis quando reúna os elementos principais previstos no art. 104 do Código Civil.

Em um contrato de prestação de serviços de guarda e controle de veículos em estacionamento, o contratante pode estipular alguns ajustes no serviço. Isso será feito para o adequar melhor às suas expectativas. Além disso, garantir que tudo esteja de acordo com a cultura da empresa. Assim, o primeiro e último contato do visitante, dentro das cláusulas do contrato, serão acompanhados pelo mesmo padrão de qualidade das outras atividades daquele estabelecimento. Também se recomenda especificar as responsabilidades civis e criminais relativas à prestação de serviços.

Portal do Trânsito – Há algum tipo de fiscalização para este tipo de serviço? Se sim, quais? Se não, quais as possíveis implicações para os empreendimentos que adotam essa iniciativa?

Rene Dias – A fiscalização da administração pública desses empreendimentos concentra-se nas condições estruturais básicas (Defesa Civil, AVCB, Fiscalização Sanitária), no exercício da atividade pelo corpo de funcionários (Ministério do Trabalho e Previdência) e no uso dos locais destinados à pessoas especiais (pessoa com deficiência e idoso) pelos órgãos executivos de trânsito municipais.

É importante lembrar que, conforme o local do estacionamento (público ou privado), a atuação da administração pública, em relação ao uso do espaço, será mais extensa ou retraída. O que define é a propriedade territorial. Quando o espaço for público, estende-se a fiscalização da administração para manter o interesse público. Neste sentido, o espaço torna-se uma ampliação da via pública (com as devidas limitações). Já no espaço privado, há uma limitação maior e a administração pública não atuará livremente. Eventuais problemas demandarão de queixa e solicitação da presença do órgão público para atuar. Não ocorrerá a autuação de forma espontânea.

Portal do Trânsito – E quanto aos valores cobrados? Quem estabelece e/ou fiscaliza?

Rene Dias – A cobrança de tarifa, independentemente de ser um estacionamento particular ou público, é reconhecidamente uma relação de consumo, onde as empresas de serviço de estacionamento figuram como fornecedores e os usuários como consumidores. Neste ponto a aplicação do Código de Defesa do Consumidor é a ligação de equilíbrio na relação entre fornecedor e consumidor.

A origem da preocupação com a prática de cobrança de valores no vasto número de estacionamentos em uma cidade, se ancora no fato de ser esta atividade uma relação desigual. Nela, o fornecedor possui privilégio na relação de consumo, pois, tem o poder de impor a forma como se executará o serviço. Ao consumidor cabe tão somente concordar ou não com o que se apresenta. Por isso, o instrumento constitucional de proteção dessa relação (art. 5º, inc. XXXII) é o Código de Defesa do Consumidor (CDC) que, conforme já mencionado, equilibra a relação entre consumidor e fornecedor.

A fiscalização de prática de preços abusivos ou mesmo venda casada será feita pelo poder público (Procon ou Delegacia do Consumidor). Este receberá formalmente a denúncia e providenciará os procedimentos administrativos ou judiciários que requererem os fatos.

Portal do Trânsito – Em que situações pode se considerar a prática de valores abusivos em estacionamentos privados?

Rene Dias – Todas as vezes que houver a desproporcionalidade no valor de mercado, cobrado na maioria dos estacionamentos privados na região, de maneira que se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza do serviço a ser prestado ou que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou ainda que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade e outras circunstâncias peculiares ao caso, serão consideradas práticas abusivas.

Portal do Trânsito – Pensando na prevenção jurídica, quais cuidados para que não haja conflitos entre as partes e o consumidor final?

Rene Dias – O ponto mais crítico para uma empresa que pretende terceirizar o seu estacionamento ou que, em seu espaço de comércio ou serviço, queira oferecer o estacionamento, terceirizado, aos seus clientes, juntamente com a cobrança justa de tarifa, é dispor claramente sobre as garantias de direitos dos usuários acerca de danos ou prejuízos provocados aos cidadãos no período em que o veículo estiver sob sua guarda, conforme a Súmula 130 do STJ e o artigo 927 do Código Civil.

Para isso, há a necessidade de cientificar o cliente. Isto deve ser feito de forma clara, por meio de cartazes e avisos e também no ticket de registro de entrada. Nestes comunicados devem estar as regras de cuidados que o cliente precisa ter para que seus direitos sejam preservados.

Portal do Trânsito – Para finalizar, como devem proceder os estabelecimentos que tenham interesse em oferecer esse benefício?

Rene Dias – Basicamente seria oferecer várias opções de pagamento como uma maneira de oferecer comodidade para o cliente, disponibilizando totens de pagamento, aplicativos, boletos, cartões de créditos e débito, além do pagamento em dinheiro.

Também deverá disponibilizar uma estrutura de segurança com serviço de ronda motorizada como reforço, no caso de grandes áreas de estacionamentos privados. Além disso, um eficiente sistema de monitoramento para inibir possíveis delitos para o controle e prevenção de sinistros e outras eventualidades.

Por fim, dispor de uma sinalização planejada é fundamental para garantir a equidade. E no caso de contar com uma equipe de manobristas, essa deverá ser devidamente habilitada, capacitada e pronta a oferecer o melhor atendimento.

Receba as mais lidas da semana por e-mail
[mc4wp_form id=32263]

Comentar

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *