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02 de novembro de 2024

Investimentos públicos ou “Indústria da multa”? Entenda para onde vai o dinheiro arrecadado com multas de trânsito


Por Mácio Amaral Publicado 14/10/2021 às 11h12 Atualizado 08/11/2022 às 21h21
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Portal do Trânsito explica, conforme o CTB, para onde deve ir a receita; reportagem também traz apontamentos sobre a suposta “indústria da multa”.

"indústria da multa"Foto: Pixabay.com

A multa de trânsito é a penalidade imposta ao condutor ou proprietário de veículo que for autuado por desrespeitar normas previstas no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), instituídas para garantir a segurança viária dos cidadãos. Muitos, porém, ainda têm dúvidas sobre para onde vai a verba arrecadada nesse processo.

Para esclarecer o assunto, o Portal do Trânsito conversou com a advogada especialista em Direito de Trânsito, Rochane Ponzi.

No seu artigo 320, o CTB aponta que a receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito será aplicada, exclusivamente, em sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito.

Diante disso, a advogada explica que o destino do dinheiro que se arrecada com as multas deve ser aplicado nesses pilares:

a) Sinalização: conjunto de sinais de trânsito e dispositivos de segurança colocados na via pública com o objetivo de garantir sua utilização adequada, compreendendo especificamente as sinalizações vertical e horizontal e os dispositivos e sinalizações auxiliares.

b) Engenharia de tráfego e de campo: conjunto de atividades de engenharia voltado a ampliar as condições de fluidez e de segurança no trânsito.

c) Policiamento e fiscalização: atos de prevenção e repressão que visem a controlar o cumprimento da legislação de trânsito. Deve ser feito por meio do poder de polícia administrativa.

d) Educação de trânsito: atividade direcionada à formação do cidadão como usuário da via pública. Deve ser feita por meio do aprendizado de normas de respeito à vida e ao meio ambiente, visando sempre o trânsito seguro.

Segundo ela, a lei também determina um percentual de 5% para um fundo de âmbito nacional destinado à segurança e educação no trânsito (FUNSET). A Lei nº 9.602/98 criou o fundo e o Decreto nº 2.613/98 regulamentou o FUNSET e designou a gestão ao Senatran.

“A fim de não pairar dúvidas sobre quais seriam os elementos de despesas de cada uma das destinações do art. 320 do CTB, a Res. 875/21 enumera um rol taxativo de situações, não deixando espaço para interpretações”, explica Rochane.

Não há diferença de aplicação conforme o órgão autuador. Ou seja, o destino de uma multa arrecadada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) é o mesmo de uma arrecadação feita por um Departamento Estadual de Trânsito (Detran), por exemplo, independente do órgão ser de esfera municipal, estadual ou federal.

“Todos os órgãos do Sistema Nacional de Trânsito precisam se preocupar com a sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito. O que muda é tão somente o âmbito de atuação territorial, que varia conforme a competência de cada um dos órgãos. Com a publicação da Lei 13.281/16, o art. 320-A do CTB passou a autorizar que os órgãos do SNT se integrem para fins de fiscalização. Permite, inclusive, compartilhamento da receita arrecadada”, destacou a especialista.

“Indústria da multa”

Ainda é muito comum se ouvir em todo país a expressão “indústria da multa”, que nasceu porque muitos brasileiros acreditam numa suposta desproporcionalidade na quantidade de multas aplicadas e quantias arrecadadas –  infrações leves geram multa no valor de R$ 88,38, infrações médias, multa de R$ 130,16, infrações graves, multa R$ 195,23, e infrações gravíssimas levam à aplicação de uma multa base de R$ 293,47.

As multas gravíssimas podem ter o seu valor multiplicado, no caso de infrações que representam maior perigo para a segurança no trânsito. A multiplicação pode ser feita por 2, 3, 5, 10, 20 e 60 vezes, modificando o valor da multa a ser paga pelo condutor.

De acordo com Rochane, uma das raízes para esse pensamento é que, desde 1998, com a criação do CTB, a sociedade passou a se deparar com mais fiscalização de trânsito. Bem como com multas mais caras que aquelas previstas no antigo CNT. Este fato gera a sensação de “indústria da multa”, porque muitas condutas infracionais comumente praticadas, que antes não se autuava, passaram a se tornar autos de infração.

“Como ninguém gosta de ser punido, ainda mais pela prática de uma conduta que por anos foi normalizada pela omissão da fiscalização, natural que se cunhasse esse termo de “indústria da multa”. Ocorre que, passados quase 24 anos de vigência do CTB, o que se constata não é a “invenção” de multas pelos agentes. Pelo contrário, se os agentes fossem multar todas as condutas que praticamos diariamente e que estão em desacordo com o Código, o número de autuações seria imensamente maior”, afirma.

Ainda assim, a especialista opina que o CTB tipifica como ilícito muitas conduta. Dessa forma, é praticamente impossível que um condutor, por mais exemplar que seja, não cometa uma única infração diariamente.

“Um exemplo disso é o condutor que esteja digitando um celular. Esse mesmo ato pode gerar punição por dirigir com apenas uma das mãos. Além disso, por estar manuseando o celular, ou ainda por estar dirigindo sem atenção”, diz.

A especialista diz não acreditar nessa “indústria da multa” que inventa infrações que não aconteceram somente para arrecadação. Nesse sentido, porém, ela entende quem reclama e orienta que o cidadão seja ativo e cumpra seu papel fiscalizador.

“Justamente quando vemos os governos, seja federal, estadual ou municipal contingenciarem os valores arrecadados, deixando de disponibilizar aos órgãos de trânsito a integralidade dessa verba a fim de que possam realizar ações que visem conscientizar a população a não cometer novas multas. Importante consignar que todo o cidadão pode fiscalizar quanto o órgão de trânsito da sua localidade está arrecadando. Haja vista que desde 2016 todos devem publicar, anualmente na internet, dados sobre o que arrecada e destino (art. 320, §2º do CTB)”, diz.

É possível também conseguir os dados através da Lei de Acesso à Informação.

“Enquanto o trânsito seguro não for uma política de governo, com a destinação aos órgãos de trânsito de 100% desse dinheiro que é “carimbado” pela lei, infelizmente esse ciclo jamais será virtuoso”, finaliza Rochane.

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