Quando o condutor comete várias vezes seguidas a mesma infração, está sujeito a quantas multas?
Infrações de trânsito continuadas. Esse é o termo utilizado para caracterizar quando um condutor comete, por meio de uma única ação, várias vezes seguidas a mesma infração de trânsito. Quando isso ocorre, o condutor está sujeito a quantas multas?
Como outras situações parecidas na legislação de trânsito, essa é uma questão que não tem uma conduta padrão dos órgãos fiscalizadores e nem dos julgadores. Muitas vezes as ocorrências são decididas por interpretação de quem as analisa.
O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) pretendia regulamentar o caso, mas teve um de seus artigos vetados, justamente o que tratava do assunto. O Art.258 em seu § 4º dizia que:
“Tratando-se de cometimento de infrações continuadas a aplicação da penalidade poderá ser renovada a cada quatro horas”.
De acordo com Julyver Modesto de Araújo, que é especialista em legislação de trânsito, o artigo foi vetado, porque o Parágrafo 4º parece ter sido concebido para caracterizar a conduta de quem estaciona em local proibido, infração que deve provocar a remoção do veículo pelo agente de trânsito e não a aplicação de sansões continuadas.
O especialista abordou esse assunto no Podcast Trânsito, episódio 63, que você pode ouvir na íntegra clicando aqui.
Atualmente não existe uma previsão legal de quanto em quanto tempo pode se autuar pela mesma conduta. No caso de estacionamento irregular, o Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito trata do assunto, de forma geral, e diz que se o veículo não for removido no período, deve ser apenas uma autuação. “Infelizmente o MBFT não explica exatamente o que é esse período. Então pode ser o dia inteiro, pode ser a semana inteira, o mês inteiro, dá a possibilidade de interpretação de que tendo sido autuado uma primeira vez e não tendo sido aplicada a remoção não se pode autuar novamente”, explica o especialista.
Julyver acredita ainda que como a infração de trânsito continuada não tem uma definição legal é possível utilizar o que está no Código Penal para crime continuado, no Art.71, que diz o seguinte:
“Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.”
Outros exemplos
Além da infração de estacionamento irregular, existem outras que podem se enquadrar no mesmo caso. O especialista cita, por exemplo, o caso de um condutor que passa com excesso de velocidade num radar, e alguns metros após, outro equipamento medidor também flagra o mesmo excesso. “É lógico que ele está numa constante, está numa velocidade única, então ele teve ali uma infração continuada, ele deve ser multado pelas duas ou apenas pela primeira? Se a gente fosse seguir por analogia o Art. 71 do Código Penal, seria apenas a primeira, havendo ainda a necessidade de aumentar a pena, o que não é previsto no CTB”, diz Julyver.
Dois exemplos muito comuns são quando a pessoa é flagrada falando ao celular e na sequência depois de alguns metros, um outro agente observa e faz a mesma autuação. E também, quando o condutor é flagrado por dois agentes de trânsito em curto espaço de tempo e lugar, sem cinto de segurança. A pessoa ao recorrer, porque nem sempre vai ter conhecimento, na hora, das duas autuações, deve ter o deferimento da segunda multa? Devem ser mantidas ambas as multas?
Julyver explica que hoje não há uma padronização em relação ao tema, mesmo nos órgãos julgadores não há consenso.
“Minha opinião é que nesses três exemplos, deve-se manter apenas a primeira, cancelando as demais. Se o condutor tem uma continuidade na sua conduta e isso tem uma proximidade tanto de tempo quanto de espaço, são poucos minutos, poucos segundos, às vezes até no mesmo minuto e no mesmo local da infração, eu entendo que deve ser mantida apenas a primeira multa”, finaliza.