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Educação para o trânsito nas escolas


Por José Nachreiner Junior Publicado 04/09/2020 às 21h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h01
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No Brasil o trânsito mata, todos os anos, um número de pessoas superior a muitos conflitos bélicos e genocídios no mundo.  Todos os especialistas em trânsito estão convencidos de que a saída para essa tragédia é a educação. Texto de José Nachreiner Junior. 

Foto: Pixabay.com

Ao final da Segunda Guerra Mundial, a população do planeta entendeu que não poderia mais admitir tamanha perda de vidas, genocídio em massa como o que o ocorreu com os judeus e que não poderia mais tolerar a estupidez e a arrogância de um país que ameaçasse a paz mundial com tamanha brutalidade.

A carta da ONU (Organização das Nações Unidas) nasce, em 1945, com o objetivo principal do respeito aos direitos e liberdades fundamentais do indivíduo, a manutenção da paz, a segurança internacional e promoção do desenvolvimento social, com melhorias nas condições de vida dos indivíduos.

Menos de vinte anos depois da publicação da carta da ONU, eclodem dezenas de conflitos sangrentos entre os EUA e o Vietnã, o genocídio de povos africanos provocados por sucessivas guerras civis, o conflito entre a União Soviética (hoje Rússia) e Afeganistão, a guerra civil no Líbano, o genocídio após a dissolução da Iugoslávia, a invasão dos EUA no Afeganistão e no Iraque, a guerra civil na Síria entre outras ações bélicas e terroristas ao redor do mundo.

Comparáveis às grandes tragédias humanas, os acidentes de trânsito no mundo são responsáveis, muitas vezes, por um número de mortes maior que as guerras e os genocídios dos séculos XX e XXI.

No Brasil o trânsito mata, todos os anos, um número de pessoas superior a muitos conflitos bélicos e genocídios no mundo.  Todos os especialistas em trânsito estão convencidos de que a saída para essa tragédia é a educação.

A educação de trânsito nas escolas é uma solução capaz de mitigar o problema.

Do ensino fundamental à universidade, o tema precisa ser curricular, para a formação de um cidadão apto a respeitar as leis do trânsito, ter comportamento solidário e assim, diminuir as ocorrências de mortes, lesões e sequelas provocadas pelos acidentes de trânsito.

É o que prevê o artigo 76 do CTB:  A educação para o trânsito será promovida na pré-escola e nas escolas de 1º, 2º e 3º graus, por meio de planejamento e ações coordenadas entre os órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito e de Educação, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nas respectivas áreas de atuação.

Prof. Julyver Modesto de Araujo, Mestre em Direito do Estado, Especialista em trânsito. Foto: Arquivo pessoal.

Segundo o especialista em trânsito Julyver Modesto, quando muito, nas escolas há algum ensinamento.

“Acredito que nas escolas, a  educação para o trânsito não precisa ser passada por meio do aprendizado técnico de sinais de trânsito e sim por valores cidadãos que serão úteis no trânsito, como gentileza, solidariedade e educação.  Vejo que há necessidade do cumprimento da lei que já está em vigor.  Por exemplo: se houvesse cobrança do ensino aprendizagem em avaliações como o Enem e durante todo o processo avaliativo dos alunos desde o ensino fundamental, a lei do CTB, em seu artigo 76, estaria sendo cumprida e nossos índices de mortes no trânsito estariam diminuindo consideravelmente”.

Neste sentido o braço da ONU, a UNESCO, em 1999, anunciou os Quatro Pilares da Educação elaborados por Jacques Delors que compreendem: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver, aprender a ser.

Na prática, na grande maioria das escolas públicas e em muitas escolas privadas, o primeiro pilar da educação não encontra competências e habilidades para ser desenvolvido. Baixos salários, falta de formação acadêmica dos professores, ausência de infraestrutura como edificações escolares, equipamentos, internet, entre outros, impede o fluxo do aprendizado dos alunos, o desenvolvimento do senso crítico e a curiosidade intelectual.

Da mesma forma, no segundo pilar da educação, os alunos brasileiros não conseguem fazer escolhas, solucionar problemas, não confiam em modelos pré-existentes e tampouco, os alunos brasileiros conseguem perceber as mudanças profundas na sociedade. No terceiro pilar da educação, os alunos brasileiros estão enfraquecidos quando o assunto é a tolerância, respeito, colaboração.

No quarto pilar da educação: aprender a conhecer fica extremamente prejudicado porque a gestão das escolas públicas e seus professores enfrentam carências de planejamento, infraestrutura e qualidade na formação do professor para incrementar programas que estimulem a inteligência, criatividade, sensibilidade, responsabilidade, pensamento crítico e ética.

Para a maioria das crianças brasileiras, a escola pública é o único caminho para desenvolver as questões relacionadas ao ensino aprendizagem e elevar os conhecimentos de cidadania.

Basta reparar nos nossos indicadores ou mesmo ver nossa colocação no IDH, o Brasil está atrás do México, atrás de 75 países, para percebermos que as coisas não vão bem e que temos muito o que avançar quando o assunto é Educação e Educação para o Trânsito.

Nas estimativas do PNUD, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, nossa situação está ainda mais crítica por conta da Pandemia, pois em países como o nosso, 86% das crianças do ensino fundamental estão sem receber nenhum tipo de educação formal, enquanto nos países com alto Índice de Desenvolvimento Humano, apenas 20% das crianças foram afetadas.

As estatísticas nos mostram um cenário aterrorizante. De acordo com o Ministério da Saúde: em 2011, o Brasil registrou 44.553 mortes resultantes de acidentes de trânsito, o número abaixou para 33.625 em 2018 e em 2019 foram registradas 30.371 mortes no trânsito brasileiro, destas, 10.674 eram de motociclistas sendo 83% do sexo masculino.  Ocupamos o desonroso 4º lugar no mundo em mortes pelo trânsito, segundo a OMS.

Os números não refletem, por enquanto, as iniciativas dos estados, que em sua maioria inserem a Educação para o Trânsito, no currículo, de forma transversal, na tentativa de formar o senso de cidadania e preparar o aluno para o trânsito, nem tão pouco o esforço de grande parte dos CFC’s para formar um condutor melhor preparado, mais educado e que não represente riscos no trânsito à sociedade.

Adriana Modesto, Doutora em transportes e Mestra em Ciências da Saúde (UNB). Foto: Arquivo pessoal.

De acordo com Adriana Modesto, doutora em transportes (UNB), “o cenário brasileiro relacionado ao trânsito e as contribuições epistemológicas da Educação, podem  assumir três sentidos: educação como redenção, educação como reprodução e educação como transformação da sociedade, e ainda que a educação pode  se apresentar como um exercício político, estabelecendo interface com os direcionamentos advindos das arenas decisórias.

No caso do trânsito, as câmaras temáticas vinculadas ao DENATRAN cumprem o papel político ao participarem da construção do modelo de educação para o trânsito a partir das letras normativas definidoras dos processos formativos para novos condutores e demais competências.

Deste modo, o modelo de “educação de trânsito” e seus resultados são fruto de construção coletiva, chancelada pela sociedade.

Por fim, considerando-se a pluralidade de realidades sociais e trajetórias de vida, acredita-se que as ações educativas precisam ser concebidas de forma a valorizar as experiências pregressas, nesta perspectiva, os sujeitos são percebidos como coautores e corresponsáveis pelo processo pedagógico, rompendo a lógica da transmissão de conhecimento e adotando a lógica do compartilhamento na construção do conhecimento, inclusive pertinente ao trânsito.

Tathiana Cidral, Engenheira e docente.

Para a engenheira e professora de química, Tathiana Cidral, “eu não me lembro de ter tido Educação de Trânsito no meu tempo de estudante, são informações que tive só quando fui cursar o CFC’s para tirar minha CNH. Sou mãe do Aldryn, ele tem 7 anos, estuda em escola privada e neste momento como milhões de alunos brasileiros, está estudando por meio de aulas remotas. Antes da pandemia, em outra escola, meu filho teve algumas noções sobre trânsito, mas agora na nova escola não consigo perceber qualquer informação, curricular ou de forma transversal neste tema.  Eu acho muito importante a criança ter educação para o trânsito. Ela pode ser pequena mas tem como ser estimulada criticamente, por exemplo, se vai de carro com o pai até a padaria e percebe que ele não colocou o cinto, ela é capaz de criticar e questionar, então acredito que a escola pode ser sim responsável pela diminuição de acidentes de trânsito”, conclui Tathiana Cidral.

No meio de um cenário catastrófico de proporções mundiais, a Suécia prova o quanto é importante a educação de trânsito nas escolas.

Entre os 25 países mais seguros para dirigir, a Suécia é quem possui o mais baixo índice de mortos por acidente de trânsito, com apenas 2,8 mortes para cada 100.000 habitantes.  Líder em assuntos sobre mobilidade urbana, entendeu que a solução para conter acidentes de trânsito está nas escolas.  Um sueco começa a aprender sobre segurança nas estradas a partir dos 4 anos de idade e continua com o assunto, de forma curricular e aplicada, até a universidade.

A importância da escola para estimular valores apontados nos quatro pilares da educação é fundamental para a construção de uma sociedade que possa trabalhar a tolerância, responsabilidade, solidariedade e respeito no trânsito ao longo do processo de ensino e aprendizagem do aluno.  São valores que, certamente, irão colaborar, para a diminuição de mortes por acidente de trânsito, valores que vão fazer com que o consumo de bebidas alcóolicas, excesso de velocidade, participação do motorista em rachas, sejam extintos ou insignificantes para as estatísticas.

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