05 de dezembro de 2025

Direitos de mais, deveres…nem tanto!


Por Rodrigo Vargas de Souza Publicado 19/03/2019 às 03h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h12
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Cobrador de ônibusFoto: Pixabay.com

Minha vida profissional começou bastante cedo e, muitas vezes, seguiu por caminhos um tanto quanto diversificados (digamos assim…). Meu primeiro emprego de carteira assinada foi como “office-boy”. Mas, antes disso já havia tido experiências que iam de cuidador de cães (ou dog sitter, como eu costumava chamar) até atendente em vídeo locadora.

Uma das minhas experiências mais atuais foi no transporte público, como cobrador de ônibus em uma empresa pública de Porto Alegre, na qual trabalhei durante uns quatro anos aproximadamente. Desses, guardo na memória diversas histórias, suficientes para escrever um livro. Uma delas, no entanto, me segue nítida como se tivesse ocorrido ontem, sobretudo quando o assunto gira em torno de direitos e deveres.

Estava eu sentado na minha roleta, naquele que parecia ser mais um dia comum de trabalho. A tabela em questão era em uma linha que, historicamente, é conhecida pela quantidade relativamente grande de idosos que transporta. Isso muito em função dos bairros pelos quais passava. Não raro o ônibus encontrava-se cheio na parte da frente, onde ficam os assentos exclusivos para idosos, gestantes e pessoas com alguma deficiência, mas vazio depois da roleta. Em uma parada, uma senhora de meia idade embarca, caminhando com dificuldade e segurando duas muletas. Ela parecia não ter idade suficiente para utilizar os assentos para idosos, mas pela sua condição física, compreensivelmente, ficou na parte da frente do ônibus. No entanto, pela falta de assentos vagos naquela parte no coletivo, manteve-se de pé, próxima ao motorista, assim como diversos outros passageiros.

Inesperadamente o ônibus para. O motorista puxa o freio estacionário e se põe de pé. “Estragou o ônibus”, pensei. Em tom altivo ele diz: “Pessoal, o negócio é o seguinte: essa senhora aqui embarcou no ônibus e veio me dizer que passou por uma cirurgia e que não pode ficar de pé. Mas eu expliquei que o ônibus tá cheio, que se ela quisesse se sentar, que podia passar a roleta que tinha mais assentos no fundo do ônibus. Mas ela diz que não pode fazer esforço e que se ela cair vai me processar. Então eu não vou seguir viagem! ”

Conclusão da história: quase que instantaneamente diversos passageiros levantaram-se cedendo seus lugares à senhora de muletas. Preocupados, obviamente, muito mais com a continuidade de suas viagens e com o cumprimento de seus compromissos que com o bem estar da senhora ou com a ameaça ao trabalho do motorista. Constrangida, ela limitou-se a agradecer a gentileza e sentar-se sem mais espalhafato.

Esse episódio suscita algumas reflexões, algumas mais razoáveis, outras nem tanto. Mas, dessa vez, antes de emitir as minhas opiniões sobre o fato, queria propor a você, caro leitor, uma dinâmica diferente: gostaria de debater a cerca das SUAS REFLEXÕES.

O que você pensa sobre esse episódio? Acha que o motorista fez certo? Você teria tomado outra atitude? Que implicações a qualidade do transporte público tem sobre acontecimentos como esse?

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Rodrigo Vargas de Souza

Sou formado em Psicologia pela Unisinos, atuo desde 2009 como Agente de Fiscalização de Trânsito e Transporte na EPTC, órgão Gestor do trânsito na cidade de Porto Alegre. Desde 2015, lotado na Coordenação de Educação para Mobilidade do mesmo órgão.Procuro nos meus textos colocar em discussão alguns dos processos envolvidos na relação do sujeito com o automóvel, percebendo a importância que o trânsito, espaço-tempo desse encontro, vem se tornando um problema de saúde pública. Tendo como objetivos, além de uma crítica às atuais contribuições (ou falta delas) da Psicologia para com a área do trânsito, a problematização da relação entre homem e máquina, os processos de subjetivação derivados dessa relação e suas consequências para o trânsito.Sendo assim, me parece urgente a pesquisa na área, de forma a se chegar a uma anuência metodológica e ética. Bem como a necessidade de a Psicologia do Trânsito posicionar-se de forma a abrir passagem para novas formas heterogêneas de atuação, que considerem as singularidades ao invés de servirem como mais um mecanismo de serialização das experiências humanas.

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