05 de dezembro de 2025

Educação para o trânsito: a arte de enxugar gelo


Por Rodrigo Vargas de Souza Publicado 25/08/2018 às 03h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h14
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Enxugando geloFoto: Pixabay.com

Há alguns dias conversava com um amigo sobre a situação do trânsito no país. Segundo ele, enquanto o trânsito não for incluído na grade curricular das escolas, falar sobre educação para o trânsito no nosso país seria como enxugar gelo. Não quis (nem quero) entrar no mérito da questão, por se tratar de um tema complexo e que, por isso, suscita uma longa discussão à respeito. Por ora, haja visto a atual situação da educação no país, me parece mais efetivo tratar o tema de forma transversal.

Os temas transversais são constituídos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) e compreendem seis áreas: Ética , Orientação Sexual, Meio Ambiente, Saúde, Pluralidade Cultural e Trabalho e Consumo. Segundo o Ministério da Educação (MEC), pode-se também trabalhar temas locais como, por exemplo, Educação para o Trânsito.

Os temas transversais expressam conceitos e valores básicos à democracia e à cidadania e obedecem a questões importantes e urgentes para a sociedade contemporânea. A ética, o meio ambiente, a saúde, o trabalho e o consumo, a orientação sexual e a pluralidade cultural não são disciplinas autônomas, mas temas que permeiam todas as áreas do conhecimento, e estão sendo intensamente vividos pela sociedade, pelas comunidades, pelas famílias, pelos alunos e educadores em seu cotidiano.

Os Temas Transversais caracterizam-se por um conjunto de assuntos que aparecem transversalizados em áreas determinadas do currículo, que se constituem na necessidade de um trabalho mais significativo e expressivo de temáticas sociais na escola. Alguns critérios utilizados para a sua constituição se relacionam à urgência social ,a abrangência nacional, à possibilidade de ensino e aprendizagem na Educação Básica e no favorecimento à compreensão do ensino/aprendizagem, assim como da realidade e da participação social. São temas que envolvem um aprender sobre a realidade, na realidade e da realidade, preocupando-se também em interferir na realidade para transformá-la.

Posto isso, é preciso fazer algumas considerações. Primeiramente a respeito de como o trânsito é visto pelo MEC. É inegável que o tema tem urgência social, tendo em vista o número de mortes e os custos que os acidentes no trânsito suscitam. Bem como a possibilidade de ensino e aprendizagem na Educação Básica. O órgão máximo da educação no país, entretanto, justifica que se aborde o trânsito como tema local e não transversal, pois, segundo o mesmo órgão, o trânsito não teria abrangência nacional, mas seria um problema localizado apenas nos grandes centros urbanos. Isso nega completamente a ideia de que o trânsito é feito não apenas de veículos, mas de pessoas. Como se a abordagem do tema dependesse de uma frota gigantesca de veículos. Ou seja, em uma pequena cidade do interior, na qual a grande maioria das pessoas se locomove a pé, de bicicleta ou mesmo de carroça, por exemplo, não houvesse trânsito. E mesmo que essa fosse uma justificativa plausível, negaria completamente a condição de um morador dessa mesma cidade vir a se mudar para um grande centro urbano. Isso é, quem nasceu no interior não precisa aprender sobre o trânsito, pois está fadado a viver o resto da sua vida e morrer na mesma cidade (onde não existe trânsito, pois a maioria só anda a pé)!

Em segundo lugar – e isso pode soar meio “teoria da conspiração”, mas basta alguma reflexão sobre o assunto para perceber nessa ideia algo não tão insano – não há como negar que, embora os acidentes de trânsito custem anualmente dezenas (ou talvez centenas) de milhões de reais à sociedade, há uma pequena parcela dela que se beneficia (e muito) desses números! Na sociedade capitalista e consumista na qual vivemos, deixo ao caro amigo que me lê (e àquele do início do texto) uma triste, porém, esperançosa opinião para a questão da educação para o trânsito: Enquanto houver quem ganhe vendendo toalhas, infelizmente, nunca deixaremos de enxugar gelo…

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Rodrigo Vargas de Souza

Sou formado em Psicologia pela Unisinos, atuo desde 2009 como Agente de Fiscalização de Trânsito e Transporte na EPTC, órgão Gestor do trânsito na cidade de Porto Alegre. Desde 2015, lotado na Coordenação de Educação para Mobilidade do mesmo órgão.Procuro nos meus textos colocar em discussão alguns dos processos envolvidos na relação do sujeito com o automóvel, percebendo a importância que o trânsito, espaço-tempo desse encontro, vem se tornando um problema de saúde pública. Tendo como objetivos, além de uma crítica às atuais contribuições (ou falta delas) da Psicologia para com a área do trânsito, a problematização da relação entre homem e máquina, os processos de subjetivação derivados dessa relação e suas consequências para o trânsito.Sendo assim, me parece urgente a pesquisa na área, de forma a se chegar a uma anuência metodológica e ética. Bem como a necessidade de a Psicologia do Trânsito posicionar-se de forma a abrir passagem para novas formas heterogêneas de atuação, que considerem as singularidades ao invés de servirem como mais um mecanismo de serialização das experiências humanas.

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