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27 de julho de 2024

Artigo: Cidades a 50 Km/h


Por Artigo Publicado 25/01/2021 às 16h51 Atualizado 08/11/2022 às 21h35
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J. Pedro Correa pretende, com seu texto, incentivar prefeitos que assumiram seus cargos neste começo de ano que estudem a redução dos limites de velocidade em suas cidades como forma de diminuir o número de fatalidades no trânsito.

J. Pedro Correa*

No começo deste mês de janeiro de 2021, a cidade de Curitiba tomou conhecimento de que mais uma das suas principais avenidas passaria a adotar o limite de velocidade de 50 km/hora. Trata-se de uma artéria importante que tangencia o centro da capital paranaense onde, até então, os motoristas p desenvolver até 60 km/hora.

Curitiba já tem uma experiência de vários anos na redução de velocidade no seu sistema viário.

A “área calma”, onde o limite é de 40 km/h e que cobre o polígono central de Curitiba, foi iniciada em 2014. As “vias lentas”, paralelas às canaletas dos ônibus expressos, estão limitadas à 30 km/h. Os planos da Secretaria de Trânsito de Curitiba é mexer em 70% das vias arteriais, reduzindo a velocidade para 50 km/h, assim como foi feito agora em janeiro na Avenida Silva Jardim.

Sinto nesta mudança de limite de velocidade um sinal mais forte de que o Brasil pode estar se preparando para adotar soluções que contribuam, finalmente, para a redução das fatalidades no trânsito cujos índices já ultrapassam em muito o limite. Enquanto países desenvolvidos exibem taxas abaixo de 5 mortes por grupo de 100 mil habitantes, o país ostenta perto de 20. Curitiba, ao lado de outras poucas cidades brasileiras, reduziu em 50% o número de fatalidades nos últimos 10 anos podendo dizer que, sim, elas atingiram a meta da ONU/OMS na década 2011-2020.

Aliás, foram estas cidades que “salvaram a pátria verde-amarela” na década mundial e são elas que, agora, podem servir de exemplo para tantas outras cidades brasileiras que, sob nova orientação municipal que acaba de ser empossada, de como atingir o objetivo de reduzir as fatalidades até 2030, durante a 2ª Década, da ONU/OMS.

Não será um caminho fácil, a começar pela continuação do enfrentamento do Covid 19, pelos recursos limitados e pelas incertezas de que poderão contar com decisivo apoio federal para ações e investimentos necessários. É bom lembrar sempre que segurança no trânsito nunca foi uma prioridade neste país, o que só ajuda a complicar mais as coisas.

A sinalização clara de Curitiba de baixar a velocidade acerta em cheio numa das maiores causas de fatalidades no trânsito.

É bom que se frise que velocidade não é um problema apenas curitibano, mas mundial e que tem merecido profundos estudos em todas as grandes metrópoles do globo. A recomendação dos especialistas para diminuir os riscos de acidentes graves é reduzir a velocidade. Sabe-se que, num atropelamento a 30 km/h, o pedestre normalmente sobrevive; a partir de 50 km/h o risco de morte é quase oito vezes maior em comparação com 30 km/h; a partir de 80 km/h, ele precisa contar com um milagre para sobreviver.

Num dos relatórios anuais sobre o desenvolvimento do trânsito no mundo, a Organização Mundial de Saúde afirma que “Aumentar 1 km/h na velocidade média dos veículos resultará em aumento de 4-5% nos acidentes fatais”. Por outro lado, na via inversa, “um corte de 5% na velocidade média pode resultar em uma redução de 30% no número de acidentes fatais no trânsito”, segundo o mesmo relatório sobre gerenciamento de velocidade.

São dados irrefutáveis e incontestáveis, que devem servir para incentivar administradores municipais, estaduais e federais a estudar a redução de velocidade para que, dentro de alguns anos, possam se orgulhar de haverem poupado a vida de milhares de pessoas graças ao menor número de acidentes.

Obviamente obrigar a sociedade a reduzir a velocidade de seus carros é medida dura, antipática e que por isso mesmo enfrenta resistência por parte de alguns grupos de inconformados.

O que os administradores de trânsito necessitam, então, é de habilidades para poder atenuar estas reações contrárias, usando com inteligência os mecanismos da boa comunicação.
Fazer uma pesquisa de opinião pública para saber o que pensa a sociedade sobre os acidentes fatais na cidade (sempre favorável da segurança), preparar a população para as mudanças de velocidades necessárias através de uma didática explicação, ajuda muito na aceitação pacífica das pessoas.

O uso adequado dos meios de comunicação – anúncios em outdoors, rádio, jornal, tv, mídia social, blogs, sites, salas de cinema – pode representar a diferença entre o sucesso e o fracasso de medidas de impacto como estas. Inserir o tema em discussões das entidades da indústria, do comércio e de serviços e eventualmente até nos sermões dos líderes religiosos – padres, pastores das igrejas locais – podem cumprir um papel complementar importante para conseguir a aquiescência da sociedade.

Isto tudo custará menos do que a cidade perderia com o custo social das mortes e ferimentos graves nos serviços hospitalares da região.

Quando o gestor municipal do trânsito se munir de dados confiáveis para mostrar que é importante e inadiável reduzir a velocidade máxima nas áreas residenciais a 30 km/h, será muito menos difícil convencer aquela parte da cidade de que a medida não tem outro objetivo senão o de proteger os moradores locais, principalmente crianças e idosos. Difícil contestar um argumento como este. Esta é uma habilidade essencial exigida dos gestores do trânsito: bom senso para tomar decisões eventualmente difíceis e habilidade para convencer a sociedade usando meios adequados.

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Há uma profusão de dados disponíveis na Internet que podem ajudar os administradores locais na tarefa de comunicação. Aqui, surge a importância do bom planejamento do departamento de trânsito da cidade que, já no começo do ano, sabe claramente todas as grandes ações que implementará durante o ano e assim, pode planejar cada uma delas no devido prazo. Assim, se você for um gestor bem sucedido nesta área e receber um cumprimento do tipo “parabéns, você teve sorte”, agradeça, sorria, sem precisar explicar quanto tempo você investiu para ter “aquela sorte”.

Minha sugestão aos gestores que pensam em enfrentar o grande desafio da velocidade em seu município, é que visitem as cidades que já lograram êxito até aqui.

São várias cidades que já se beneficiaram do bom trabalho feito pelos grupos locais do Programa Vida no Trânsito, WRI, Bloomberg, GRSP e de consultores qualificados. É simples e barato.
A colaboração entre países e principalmente entre cidades do mundo inteiro tem desempenhado um papel importante para o crescimento da segurança no trânsito no mundo atual. Grandes metrópoles se espelharam em exemplos de outras para montar e impulsionar seus próprios programas.

Os conceitos do Visão Zero, da Suécia, por exemplo, foram e continuam sendo utilizados por nações de todos os portes e de qualquer parte do mundo. Isto pode e deve acontecer por aqui também onde a limitação de recursos financeiros exige ter coragem de copiar ou melhor de adaptar certos tipos de ações que deram certo em outros lugares às características locais. A sociedade brasileira agradece.

*J. Pedro Correa é Consultor em Programas de Trânsito

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