O drogômetro pode substituir o exame toxicológico? Especialistas opinam
O Portal do Trânsito entrevistou especialistas para entender as principais diferenças entre o drogômetro e o exame toxicológico. Além disso, se há a possibilidade de um substituir o outro.
É consenso entre os especialistas que o uso de drogas ao volante compromete a segurança do trânsito. O que não é unanimidade é a forma de fiscalizar a utilização dessas substâncias ilegais no Brasil: drogômetro ou exame toxicológico.
Atualmente, o exame toxicológico de larga janela de detecção é a forma como se encontrou de averiguar se condutores utilizaram ou não drogas ao volante. Ele é obrigatório para motoristas das categorias C, D e E, na obtenção e renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Além disso, aqueles com idade inferior a 70 anos deverão fazer o exame toxicológico periódico a cada 2 anos e 6 meses.
Recentemente, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) começou a testar, nas rodovias federais, os drogômetros que têm a função de detectar o uso recente de substância psicoativa. Os testes serão feitos com motoristas voluntários. Neste primeiro momento, as amostras positivas não vão configurar infração legal, uma vez que os aparelhos ainda não têm homologação para fiscalização.
Diante disso, o Portal do Trânsito entrevistou especialistas para entender as principais diferenças entre o drogômetro e o exame toxicológico. Além disso, se há a possibilidade de um substituir o outro.
Complementares não excludentes
Para o Dr. Flávio Emir Adura, médico especializado em medicina do tráfego e Diretor Científico da Abramet, o teste com o drogômetro pode aliar-se aos testes já realizados com o exame toxicológico de larga janela para desencorajar que motoristas dirijam sob a influência de substâncias que comprometam sua capacidade psicomotora ao conduzir veículo, mas não o substituir.
“Os testes capilares têm na larga janela de detecção a sua principal vantagem. Uma vez que a análise segmentar do cabelo pode confirmar o abuso de uma droga nos últimos meses, enquanto as realizadas na saliva, suor, sangue ou urina, como o drogômetro, fornecem informações de curto prazo”, explica.
O médico destaca que não é possível abolir que motoristas conduzam veículos automotores sob o efeito de substâncias ilícitas. Em contrapartida, é necessário avaliar o comportamento do usuário por um longo período. “Para essa finalidade de impedir que esse condutor se habilite ou renove sua Carteira Nacional de Habilitação- CNH, a análise do cabelo é o método apropriado”, garante.
Prevenção X fiscalização
Já Rodolfo Rizzotto, coordenador do SOS Estradas, defende que o papel do exame toxicológico é de prevenção e não de fiscalização.
“O objetivo do exame toxicológico de larga janela é identificar o usuário regular de drogas. Nesse sentido, o laudo aponta os tipos de drogas utilizados e grau da presença no organismo. Quando ele é positivo significa que o indivíduo utiliza com tanta frequência que está inabilitado para dirigir com segurança mesmo quando em abstinência de alguns dias”, explica.
Para o especialista, outra vantagem do exame toxicológico é afastar do volante o condutor que testar positivo. “Nesse caso, a CNH está suspensa até apresentação de novo exame, 90 dias após o primeiro e que apresente laudo negativo. Quando comparamos, por exemplo, com o etilômetro, poucos dias depois o condutor já está habilitado novamente, enquanto correm os prazos dos recursos. No caso do toxicológico essa possibilidade não existe”, pontua.
Rizzotto explica também que a opção pelo exame toxicológico foi feita após estudos para desestimular o uso de drogas.
“Qualquer especialista em tratamento de dependentes químicos sabe como é difícil que o usuário deixe de consumir drogas por 90 dias. Os resultados obtidos são extraordinários mas infelizmente muita gente criticou o exame de larga janela sem conhecer absolutamente nada sobre o tema. Nós, do SOS Estradas, fomos buscar informações em primeiro lugar, de quem pagava para fazer esse exame, não apenas dos laboratórios”.
Ainda segundo o coordenador, outro ponto positivo é que estudos identificaram que, considerando o exame na renovação, o prazo de 30 meses do periódico e mais os exames de admissão e randômicos nas empresas, é praticamente possível testar todos os condutores destas categorias em cinco anos. “Utilizando testes como drogômetro vamos demorar mais de 40 anos e jamais atingiremos sequer 80% dos condutores testados”, cita Rizzoto.
Importância do exame toxicológico
Segundo o representante da Abramet, os sinistros com veículos pesados são os que representam maior custo, seja em vidas perdidas ou em danos materiais. Representam 4% da frota e estão envolvidos em 38% dos sinistros nas rodovias brasileiras e em 53% dos sinistros com vítimas fatais. “Estudos e operações com motoristas testados nas rodovias comprovaram que, em média, 30% dos caminhoneiros brasileiros usam drogas para suportar a exaustiva jornada de trabalho a que são submetidos. No caso das cargas perecíveis, esse índice chega a 50%, conforme identificou o Ministério Público do Trabalho em ações conjuntas com a Polícia Rodoviária Federal”, conta.
Ainda, conforme o médico, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal, já nos seis primeiros meses de exigência do exame toxicológico de larga janela, houve queda de 38% nos acidentes em rodovias federais. “E no primeiro ano de vigência da Lei 13.103/15, uma economia de mais de R$ 70 bilhões aos cofres públicos. Os dados são da Escola Nacional de Seguros”, conclui.
Rizzoto complementa dizendo que em 2019, segundo dados do Denatran, foram flagrados pelas operações da Lei Seca, em todo país, tanto em rodovias como nas ruas, 295 motoristas habilitados na categoria D sob efeito de álcool (droga lícita). Por outro lado, no mesmo ano, 23.000 motoristas da categoria D deram positivo no exame toxicológico de larga janela (drogas ilícitas). Segundo ele, isto mostra a gravidade da situação e a ponta do iceberg que o exame toxicológico revelou.
“Para que se tenha uma ideia da importância do exame de larga janela, foi através dele que foi possível identificar que as anfetaminas, o popular rebite, não representam mais sequer 10% da droga encontrada no organismo dos motoristas. Em outras palavras, a cocaína impera, com quase 70% do total”, conclui.