15 de novembro de 2025

A violência no trânsito e nas redes sociais


Por Márcia Pontes Publicado 11/01/2016 às 02h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h30
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Redes sociaisRedes sociais e o trânsito.

O que há em comum entre trânsito e redes sociais para além daqueles que dirigem online no celular e offline no trânsito? São terrenos diferentes o território da internet, das redes sociais, das páginas de comentários, e o território das vias terrestres abertas à circulação regidas pelo CTB. Mas, uma coisa se vê em comum por parte de muitos: a intolerância, a arrogância, o desrespeito e a agressividade. Isso faz com que, seja pelo que lemos nas redes sociais, seja pelo que testemunhamos no trânsito nosso de cada dia, sinceramente, nos cause certo medo da raça humana. Estamos atingindo e vivenciando níveis de agressividade e violência gratuita como nunca se viu antes.

No trânsito são as “fechadas”, as buzinadas que ocultam ao mesmo tempo um latido forte de cão territorialista agressivo e um palavrão. É a pressa de quem se “acha” no direito de exclusividade em via pública, no direito de acelerar mais que os outros, no direito de agredir quem não dá a vez para Vossa Majestade passar, e de tantos outros “dereitos” sem obrigações editados pela lei pessoal de cada um e que ignora as leis oficiais vigentes. Sejam de trânsito ou de cordialidade, de respeito, as regras de convivência humana, harmônicas e pacíficas.

Nas redes sociais são os arroubos de arrogância e intolerância que fazem com que pessoas que nunca se viram antes, e provavelmente nunca se encontrarão pessoalmente além de um tribunal, se digladiem em um mar de ofensas, xingamentos e violência gratuita.

No mundo de hoje basta que um não pense como o outro para ser declarada a guerra. Parece que não há lugar para o ponto e contraponto; para os diferentes olhares, ângulos e opiniões que possibilitam ver a questão por diferentes pontos de vista.

Considerando que somos dentro do carro o que somos na vida; que ao dirigir refletimos e extravasamos o nosso estado de espírito, de ânimo, de humor e até a nossa agressividade e educação, não fica difícil tentar compreender o comportamento, a agressividade das pessoas no trânsito, o que causa acidentes e o que consegue piorar as coisas e evolui para feridos e até mortos em brigas de trânsito.

Se as pessoas já são capazes de brigar, agredir, ofender e até incitar o ódio e a violência em postagens em redes sociais… se conseguem pregar e fazer a violência pelas palavras, imaginem no trânsito, um espaço permeado de agentes estressores, fatores ansiogênicos e que serve de gatilho para conflitos, desentendimentos, acidentes, ofensas e outras formas mais de agressividade.

Sempre que assistimos os noticiários sobre a violência no trânsito e somos chamados (muitas vezes, por nossa própria consciência) a opinar sobre as causas e sobre o que precisa ser feito para eliminá-las, não raro são apontadas as mesmas opiniões. Uns dizem que a violência no trânsito é causada por quem bebe e dirige; outros, por quem dirige sem habilitação, com a CNH vencida ou cassada, sob o efeito de drogas, porque não respeita leis de trânsito, porque acelera demais, e por aí vai.

Mas, se quisermos de verdade, tentar explicar a origem dessa violência temos que olhar para o trânsito como o fenômeno social que ele é e que, não raro, o transforma em um campo de batalha responsável pelo genocídio em via pública.

O século 21 veio carregado de inovações, de mudanças rápidas, de novidades tecnológicas, de celulares de última geração em que se faz de tudo com eles, até ligação telefônica.

No século 21 as pessoas estão perdendo a humanidade, estão mais individualistas, egoístas, mais agressivas, valorizam mais o ter do que o ser e basta um olhar atravessado para que se meçam, se agridam gratuitamente e se ataquem com muito mais adrenalina do que qualquer animal de rinha. Seja pelas redes sociais, atrás da telinha do computador ou do Smartphone.

Virtudes próprias do ser humano como o respeito ao outro, a tolerância, a educação e a própria humanidade estão cada vez mais em falta. Seja naquela que atropela e sai carregando o corpo em cima do capô, no parabrisas ou arrastando pelo asfalto, seja por aqueles que pregam toda a forma de violência, intolerância, xenofobia, racismo e agressões gratuitas pelas redes sociais.

É por essas e outras que certos pertencentes à raça humana começam a meter medo. Até porque nunca se sabe que tipo de pessoas cruzará a sua frente em uma esquina, em um cruzamento, em um semáforo ou rotatória.

É por essas e outras que a questão da violência no trânsito está para muito além das infrações, autuações e pontos na carteira ou da explicação simples e linear de que a violência no trânsito é feita e pode ser explicada somente pelos comportamentos de quem infringe algum tipo de lei de trânsito.

O trânsito é um fenômeno social interligado com essas e outras variáveis além das mencionadas até aqui. Trânsito é comportamento, tem relação direta com humores, com traços de personalidade, com a agressividade, a visão de mundo, a formação, o modo de agir, de pensar e até o modo de exercer a própria existência no mundo.

Violência no trânsito é um fator social que precisa ser tratado e compreendido em sua complexidade não só pelos psicólogos, os sociólogos e outros especialistas. Mas, por cada um de nós. Quem sabe, este enfoque ajude a muitos a compreenderem o modo como estão dirigindo as suas vidas e os seus veículos, e de quem forma isto afeta à todos como um todo.

Márcia Pontes

Meu nome é Márcia Pontes, sou educadora de trânsito em Blumenau (SC), Graduada em Segurança no Trânsito na Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) e colunista de assuntos de trânsito do Portal de Notícias Blumenews. Sou pesquisadora do medo de dirigir e dos métodos de ensino da aprendizagem veicular pelo método decomposto, desenvolvido na Suíça e difundido em autoescolas italianas.Em 2010 iniciei nas redes sociais um trabalho de Educação Para o Trânsito Online (EPTon) utilizando a força das mídias sociais (Orkut, Facebook, Blog, MSN, Twitter, Youtube) com foco no acolhimento emocional, aprendizagem significativa e dicas de direção defensiva, ética e cidadania no trânsito.Escrevo o Blog Aprendendo a Dirigir voltado para alunos em processo de habilitação nos CFC e para motoristas habilitados com dificuldades e medo de dirigir. O foco deste trabalho voluntário reconhecido internacionalmente leva acolhimento emocional, aprendizagem significativa e fundamentos de ética, cidadania e humanização do trânsito para evitar acidentes, sobretudo por imperícia.No ano de 2012 publiquei o livro digital Aprendendo a Dirigir: aprendizagem pelo método decomposto para evitar traumas e acidentes durante a (re)aprendizagem da direção veicular. Em 2013 publiquei o livro Aprendendo a Dirigir: um guia prático de exercícios para quem tem medo de dirigir.Sou apaixonada por trânsito, respiro, pesquiso cientificamente e vivo o trânsito com compromisso existencial. A principal luta da minha vida: contribuir para rever e atualizar os métodos de ensino da direção veicular no Brasil substituindo o adestramento do aluno e a memorização pela construção de conceitos e de significados sobre o ato de dirigir defensivamente.

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