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12 de dezembro de 2024

Quando eles vão embora cedo demais


Por Márcia Pontes Publicado 16/05/2016 às 03h00 Atualizado 02/11/2022 às 20h27
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Morte de jovensO tempo não volta como nos filmes de campanhas premiadas de acidentes de trânsito.

Não existe dor maior, vazio mais profundo e perda mais irreparável do que a da morte. Cada vez que sabemos da morte de alguém conhecido morremos junto. Quando é alguém desconhecido, por alguns momentos nos comovemos, sentimos, nos colocamos no lugar da família, dos pais, dos filhos, mas voltamos rapidinho à nossa realidade porque não suportamos. Quando é nosso pai, nosso filho, marido, esposa, amigo, aí desmoronamos. Nunca mais somos os mesmos. A sensação é de paralisia, desespero, não acreditamos, a ficha não cai. Só quem foi acordado com a notícia de um acidente durante a madrugada sabe como é o mundo desmoronar sobre nós. Nada mais importa: carro, riqueza, status, ostentação, os bens que construímos ao longo de toda a nossa vida ou tudo aquilo que não temos e que faz falta. Nada mais faz mais falta do que a vida.

Nada mais faz mais falta do que o bom dia a quem se foi e nunca mais vai voltar. Nada mais faz mais falta do que o sorriso, a alegria, o abraço, a presença física de quem amamos. Pensem na dor de um pai que perde seu filho cedo demais. Alguns, ainda bebês, crianças, adolescentes, ou mesmo adultos e idosos. Mas, o que importa mesmo é que eles nunca mais voltarão porque foram vítimas de alguém que agiu com imprudência, perícia, negligência, ou vítimas de si mesmos. O tempo não volta como nos filmes de campanhas premiadas de acidentes de trânsito, em que identificamos o erro, o reparamos e pedimos desculpas.

Nossos jovens continuam espertos demais, desafiadores demais, autoconfiantes demais. Eles já nascem bem informados, com a tecnologia na mão, mas, por algum motivo há ruído na comunicação e eles não captam a mensagem de autocuidados. Desde que se inventou o automóvel e os outros tipos de veículos são eles que encabeçam todo o tipo de estatística sobre acidentes, mortos e feridos.

Aquelas cenas trágicas com carros capotados, divididos ao meio, destruídos, os corpos espalhados e a família em desespero que a realidade nos mostra a cada dia não os toca, não os sensibiliza. Eles não conseguem entender que não estão imunes e tampouco se colocar no lugar das vítimas e de suas famílias. Eles parecem e demonstram não acreditar que há antídoto e que acidentes só “acontecem” com os outros.

Quantos morreram tirando selfie enquanto aceleravam e viam o ponteiro do velocímetro estar próximo ou atingir o máximo? Quantos morreram acelerando o carro novo e potente que ganharam ou emprestaram dos pais mesmo com pouco tempo de habilitação? Quantos morreram ao volante ou de carona segurando o celular, a lata ou garrafa de cerveja ou destilado misturado com energético? Quantos morreram ou mataram os seus melhores amigos depois de estar com eles há minutos comemorando a alegria da juventude, o final das aulas, o final de semana ou até mesmo o aniversário?

Informação parece não ser o problema, pois pertencem à geração Y, nasceram na era da tecnologia em que se acessa tudo com um simples toque na tela. O problema é o modo como são seletivos: se a realidade cotidiana nos mostra tragédias no trânsito eles pulam e não acessam. Se acessam, é por curiosidade, mas o que leem e veem não lhes é significativo.

O comportamento de risco continua sendo o mesmo: festas, baladas, comemorações de aniversário que deveriam ser para celebrar a vida e mais um ano entre nós. Só que terminam em tragédia.

Ao lado do carro capotado as latas de cerveja, garrafas de bebida alcoólica. Não raro, corpos atirados pelo vidro porque relaxaram tanto, confiaram tanto ao ponto de estarem sem cinto. “Não dá nada”, pensam. E em questão de minutos o riso, a alegria, a gargalhada farta e sincera vira grito de dor, de desespero, vira choro e pedidos de socorro antes de ficarem inconscientes como resultado da colisão que poderia ter sido evitada. Depois que o previsível se confirma nada mais pode ser feito. O tempo não volta.

Balada, para muito jovens, só faz sentido se for de carro. Para tantos, só faz sentido se tiver bebida alcoólica. Carona com alguém sóbrio, taxi ou transporte coletivo nem pensar. “É palha”. Tem o carro prá quê?

A educação para o trânsito, o diálogo, a informação, a orientação e a construção de limites começa em casa, mas vivemos uma geração de filhos desobedientes que não ouvem os seus pais, e isso não significa que sejam filhos mal educados. Pelo contrário: muitos são amorosos, carinhosos e sem saber, despedem-se de seus pais pela última vez com beijos e abraços. Eles sabem o que fazer, eles sabem as consequências de beber e dirigir, de acelerar, de transgredir no trânsito, de não usar cinto de segurança e de não exigir que os outros passageiros o usem. Eles apenas ignoram os autocuidados e os conselhos dos pais. Eles apenas ignoram e todos se machucam. Todos pagam um preço alto demais.

O nosso maior desafio enquanto cidadãos, pais e sociedade é encontrar uma linguagem que faça sentido para os nossos jovens e possibilite a aproximação, o acesso à eles, aos seus interesses e os façam adotar práticas seguras para viver e dirigir.

Precisamos saber onde e como nossos jovens estão, nos aproximarmos deles, encontrar um canal de diálogo e de orientação que realmente funcione. Precisamos alertá-los das consequências de todas as transgressões possíveis na vida e no trânsito e para isso, a participação de todos é fundamental.

Conversem mais com seus filhos, abracem mais, beijem mais, orientem mais. Negocie limites com eles. Mostre as consequências de cada ato impensado na vida e no volante.

Os mais jovens tendem a testar toda a forma de autoridade, começando pela do pai e da mãe. Em algum momento transgredirão alguma regra familiar ou social para tentar mostrar que já são gente grande e sabem se virar sozinhos.

Não há outro caminho: ou nos protegemos uns aos outros ou continuaremos a ver nossos filhos indo embora cedo demais.

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