Mais veículos e mais mortes: nossa necro-política viária
Ainda que uma frota grande de veículos não seja necessariamente um fator determinante para a mortandade no trânsito (disso temos como exemplo a Europa), o certo é que somando-se o agigantamento da frota com a falta de educação e conscientização, da embriaguez ao volante, das estradas malcuidadas e da falta de fiscalização das autoridades, o aumento das mortes acaba sendo inevitável.
De acordo com os levantamentos do Instituto Avante Brasil, baseados nos dados do DENATRAN (Departamento Nacional de Trânsito), entre 1995 e 2010, a frota de veículos no Brasil cresceu 143%, ficando 2,5 vezes maior. Isso porque, em 1995, havia no país 26.609.232 veículos, montante que, em 2010, saltou para 64.817.974 veículos. Veja:
Só na última década (2001/2010) a frota nacional de veículos aumentou 101,2%. Em contrapartida, no mesmo período, o número absoluto de mortes no trânsito cresceu 40,3%, atingindo uma taxa de crescimento de mortes de 4,06% ao ano; enquanto a taxa de mortes por 100 mil habitantes cresceu 26,6% (cálculos baseados nos dados do Datasus-Ministério da Sáude).
Dessa forma, de 30.524 mortos no trânsito em 2001, saltamos para 42.884 em 2010 (aumento de 40,3%) e, de uma taxa de 17,7 mortos/100 mil habitantes há dez anos, alcançamos a de 22,4 mortes/100 mil habitantes, em 2010 (aumento de 26,6%).
O que se evidencia é que, apesar do crescente número de mortes no país, a frota de veículos também é cada vez mais expressiva, sendo seu aumento, inclusive, incentivado pelo governo (com iniciativas como a redução do IPI, por exemplo), sem que junto sejam criadas medidas de prevenção e de educação que visem ao combate a tanta animosidade (agressividade) no caótico e nefasto trânsito brasileiro.
Se levarmos em consideração a projeção realizada pelo Instituto Avante Brasil, que calculou 46.395 mortes no trânsito apenas em 2012, bem como a frota nacional no mesmo período, qual seja, 75.179.955 (atualizada até outubro/12 pelo DENATRAN), verifica-se um crescimento de 135% da frota nacional, entre 2001 e 2012 e de 52% no número de mortes no trânsito (mais de 4% ao ano).
No Brasil, além de não enxergarmos e não agirmos contra a gravidade de um grande e calamitoso problema, contribuímos para fomentá-lo ainda mais.
O incentivo econômico para um maior consumo de veículos é salutar do ponto de vista mercadológico (econômico). Não há dúvida que isso gera mais impostos e mais empregos. Porém, paralelamente à visão mercadológica (regida pela lógica do capitalismo neoliberal), jamais deveríamos abrir mão (concomitantemente) da visão antropológica (preservação do ser humano). Quando privilegiamos somente o mercadológico, sem o necessário equilíbrio do antropológico, estamos criando, muitas vezes, todas as condições para o desenvolvimento de uma política tanatológica, ou seja, uma necro-política. Esse é o caso dos acidentes de veículos e mortes de trânsito no Brasil: fazem parte dessa necro-política que reina sobre o massacre tanatológico no trânsito.
*LFG – Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Estou no www.professorlfg.com.br.
**Colaboraram: Natália Macedo Sanzovo – Advogada, Pós Graduanda em Ciências Penais e Pesquisadora do Instituto Avante Brasil e Mariana Cury Bunduky – Advogada, pós graduanda em Direito Penal e Processual Penal e Pesquisadora do Instituto Avante Brasil.