07 de dezembro de 2025

Tecnologia: uma arma subutilizada durante a pandemia


Por Rodrigo Vargas de Souza Publicado 20/01/2021 às 20h51 Atualizado 02/11/2022 às 19h59
Ouvir: 00:00

A tecnologia a favor do transporte coletivo urbano em tempos de pandemia. Leia o texto de Rodrigo Vargas.

Foto: Divulgação autor.

Como usuários do transporte público, conversávamos noite dessas, minha esposa e eu, sobre a dificuldade em se estabelecer e, sobretudo, fiscalizar os limites de passageiros impostos durante a pandemia do Covid-19. A complexa equação demanda de passageiros X oferta de ônibus, que antes da pandemia já não era lá muito bem resolvida. Com a necessidade de um maior distanciamento como forma de (tentar) estabilizar e diminuir o contágio, trouxe à área do transporte de passageiros desafios nunca antes imaginados.

No entanto, tais esforços parecem não terem sido em vão.

Segundo dados da ATP  (Associação dos Transportadores de Passageiros de Porto Alegre), nos primeiros 6 meses de pandemia somente 52 funcionários do transporte coletivo da cidade contraíram Covid-19. Número que representa 0,8% do total de colaboradores.

O percentual é inferior ao de toda a população de Porto Alegre, que atualmente é 1,33%“, afirmou o engenheiro de transporte da ATP Antônio Augusto Lovatto, em nota no mês de agosto.

Mas com o implemento de certas tecnologias, alguns esforços se tornariam desnecessários.

Voltando à conversa com minha esposa. Lembro de ter recebido com incrédulo espanto o seu relato de que o ônibus no qual ela estava fora parado por agentes de trânsito. O objetivo era efetuar uma contagem de passageiros e assegurar que estes encontravam-se dentro dos limites estipulados pelo decreto municipal vigente na época.

Espantado sim. Não pela ação em si, mas pela forma como fora realizada. “Em pleno ano de 2020, contagem manual de passageiros, sério?!“.

Instigada pela minha reação, ela perguntou que outras formas seriam possíveis para realizar tal tarefa. Lembrei a ela que recentemente fora instalado um sistema de GPS que permite ao usuário saber com uma precisão quase total a quantos minutos cada ônibus encontra-se do ponto no qual ele se encontra. Através do aplicativo baixado para acessar essa funcionalidade, o próprio usuário poderia contribuir com dados como lotação, tempo e qualidade da viagem, controle de origem e destino por linha. Assim como diversas outras informações.

Habilmente, como a incorporar o advogado do diabo, ela argumentou que muita gente não tem internet no celular para a utilização desse tipo de serviço. Rebati afirmando que os próprios ônibus poderiam disponibilizar wi-fi aos passageiros. O golpe final veio quando, irrefutavelmente, ela afirmou que muitas pessoas poderiam simplesmente não querer baixar o aplicativo ou utilizarem tal serviço.

Consciente de ter perdido aquela batalha (mas não a guerra!), abandonei aquela hipótese.

Esqueçamos o aplicativo, a internet e o GPS então! E quanto às câmeras?” – perguntei. Ela sem entender muito perguntou o que tinham as câmeras? “Ora, existem softwares que, integrados a câmeras de monitoramento, realizam a contagem de pessoas automaticamente“. Coincidentemente, alguns dias depois o amigo Luiz Renato Mattos, CEO e Co-Fundador da OnBoard Mobility, postou um interessante artigo falando exatamente sobre isso.

Imagine a maravilha de chegar numa parada de ônibus e, além de saber exatamente em quanto tempo seu ônibus chegará, como já ocorre hoje, poder escolher, dentre as linhas que atendem àquele ponto, o veículo com menor lotação? Para além da questão da saúde pública, que aparentemente irá nos preocupar por mais algum tempo ainda, as implicações desse tipo de tecnologia na qualidade do serviço seriam imensuráveis. A partir disso, a oferta de um serviço de transporte público de fato com qualidade, mais sustentável, racionalizado e, quem sabe, até sob demanda deixará de ser um salto imenso e passará a ser apenas mais um pequeno passo.

Rodrigo Vargas de Souza

Sou formado em Psicologia pela Unisinos, atuo desde 2009 como Agente de Fiscalização de Trânsito e Transporte na EPTC, órgão Gestor do trânsito na cidade de Porto Alegre. Desde 2015, lotado na Coordenação de Educação para Mobilidade do mesmo órgão.Procuro nos meus textos colocar em discussão alguns dos processos envolvidos na relação do sujeito com o automóvel, percebendo a importância que o trânsito, espaço-tempo desse encontro, vem se tornando um problema de saúde pública. Tendo como objetivos, além de uma crítica às atuais contribuições (ou falta delas) da Psicologia para com a área do trânsito, a problematização da relação entre homem e máquina, os processos de subjetivação derivados dessa relação e suas consequências para o trânsito.Sendo assim, me parece urgente a pesquisa na área, de forma a se chegar a uma anuência metodológica e ética. Bem como a necessidade de a Psicologia do Trânsito posicionar-se de forma a abrir passagem para novas formas heterogêneas de atuação, que considerem as singularidades ao invés de servirem como mais um mecanismo de serialização das experiências humanas.

Comentar

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *