10 de julho de 2025

Ministério dos Transportes faz alerta sobre exigência de toxicológico para categorias A e B

Proposta aguarda sanção presidencial e reacende debate sobre custo, impacto social e efetividade da medida; especialistas divergem sobre alcance da obrigatoriedade.


Por Mariana Czerwonka Publicado 25/06/2025 às 08h15
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O Ministério dos Transportes manifestou preocupação com possíveis impactos sociais negativos da ampliação da exigência do exame toxicológico para obtenção da CNH nas categorias A e B. Foto: mahod84 para Depositphotos

O Ministério dos Transportes manifestou preocupação com possíveis impactos sociais negativos da ampliação da exigência do exame toxicológico para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) nas categorias A e B. Em nota divulgada ao portal G1, a pasta afirmou que a medida, aprovada pela Câmara dos Deputados em 29 de maio, pode representar uma barreira econômica significativa, sobretudo para jovens e pessoas de baixa renda.

“A obrigatoriedade do exame toxicológico tende a encarecer ainda mais esse processo, criando uma barreira adicional ao acesso à CNH — principalmente entre jovens e pessoas de baixa renda”, declarou o ministério.

O Projeto de Lei 3965/21 estende a obrigatoriedade do exame toxicológico a todos os novos condutores do país, inclusive os que buscam habilitação para veículos de passeio e motocicletas. Atualmente, exige-se o exame para condutores das categorias C, D e E. A proposta está agora sob análise da Presidência da República, que pode sancioná-la integralmente ou vetar trechos com base nos impactos sociais e nas recomendações técnicas enviadas por diferentes órgãos do governo federal.

De acordo com o Ministério dos Transportes, o custo total para obtenção da CNH já é alto para a população de menor renda, especialmente para quem ganha até um salário mínimo. A inclusão do exame toxicológico, cujo valor pode ultrapassar R$ 100, pode tornar o processo ainda mais inacessível.

“A decisão sobre sanção ou veto ao projeto é de responsabilidade da Presidência da República, que fará uma avaliação abrangente dos impactos para os motoristas e para a Política Nacional de Trânsito”, concluiu a nota oficial.

Especialistas têm visões distintas sobre a medida

Enquanto o Ministério aponta os riscos de exclusão social e aumento de custos, especialistas em trânsito e segurança viária divergem quanto à eficácia e à necessidade da medida.

Para o professor Dr. David Duarte Lima, especialista em segurança viária ouvido em matéria recente do Portal do Trânsito, exigir o exame toxicológico de candidatos que ainda não têm autorização para dirigir é um equívoco conceitual. “O exame feito antes de o candidato se habilitar, apenas demonstra que, nos três meses anteriores, essa pessoa não utilizou drogas ilícitas — mas esse é justamente um período em que ela ainda não dirigia. Não há impacto real na segurança viária”, explica.

David também aponta o alto custo como fator preocupante.

“Com base no número de habilitações emitidas anualmente, falamos de mais de R$ 400 milhões por ano pagos pelos cidadãos para um exame que não traz retorno prático. É um gasto que beneficia laboratórios privados, sem aplicação direta em campanhas educativas ou na melhoria da formação de condutores.”

O especialista em trânsito Celso Mariano, diretor do Portal do Trânsito e da Tecnodata Educacional, concorda que a proposta desvia o foco do verdadeiro problema: a baixa efetividade da fiscalização no Brasil. “Temos leis rigorosas, como a própria Lei Seca, mas que não são aplicadas de forma consistente. Isso enfraquece a legislação e transmite a falsa ideia de impunidade”, avalia.

Segundo ele, exigir mais exames pode ter apelo político, mas não resolve a raiz do problema. “O modelo atual do exame toxicológico já apresenta falhas. Ele é caro, não atinge todos os condutores e pode ser facilmente contornado por quem conhece as janelas de detecção”, alerta.

Outro lado

Por outro lado, há especialistas que defendem a ampliação da exigência como uma política pública necessária. É o caso do médico do tráfego Dr. Alysson Coimbra, diretor da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (ABRAMET). Ele vê o toxicológico como uma ferramenta de caráter preventivo e educativo, ainda mais relevante diante do crescimento do consumo de substâncias psicoativas.

“O toxicológico permite identificar padrões de uso crônico que são incompatíveis com a direção segura. Ele não é um exame de flagrante, como o etilômetro. É uma forma de mapear riscos antes mesmo de o cidadão ter acesso à direção, o que pode contribuir para reduzir tragédias futuras”, defende.

Dr. Alysson também relativiza a crítica ao custo da medida. Para ele, o ônus financeiro decorre da falta de investimentos históricos em prevenção. “O exame é uma consequência da ausência de políticas estruturantes no combate às drogas. Ele é imperfeito, mas é o que temos hoje para tentar corrigir uma realidade preocupante”, argumenta.

Prevenção exige integração de políticas

Apesar das visões distintas, todos os especialistas concordam que a segurança viária depende de ações coordenadas e integradas. O uso de ferramentas tecnológicas, como o drogômetro, ainda em fase de regulamentação, aparece como alternativa promissora. Isso, desde que acompanhado de campanhas educativas consistentes, formação de condutores mais qualificada e, principalmente, fiscalização efetiva.

A decisão sobre a sanção presidencial da proposta que amplia a exigência do exame toxicológico para todas as categorias permanece em aberto. Mas uma coisa é certa: a discussão vai além do texto legal. Ela envolve o equilíbrio entre direito à mobilidade, responsabilidade no trânsito e o papel do Estado na proteção da vida.

1 comentário

  • GEORGE JAMES
    26/06/2025 às 20:25

    O comentário do Dr. Davi Duarte Lima atingiu de forma clara e objetiva o centro da questão.
    O único efeito prático será o encarecimento do processo, com a criação de mais uma fonte de renda para os laboratórios.

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